Crônica de segunda #5

Hoje vim falar de saudade

Tem pessoas que marcam nossas vidas, meu tio foi uma dessas, minha infância foi mais colorida com sua presença, minha adolescência mais divertida e minha fase adulta, bom essa infelizmente não o tive por muito tempo.

Fui criado por meus pais, mas morava perto da minha avó e cresci com o meu tio, me ensinou a gostar de música boa, filmes e desenhos. Era uma pessoa tão carismática, tão carismática que não tinha inimigos, e todos gostavam de estar em sua presença, o seu carisma era invisível como a gravidade, mas ele atraia as pessoas para si sem esforço algum. Uma pessoa muito brincalhona, porem discreto nunca gostou de chamar a tenção, as melhores lembranças que tenho de minha infância é com ele presente, foi esse super-tio que me ensinou a andar de bicicleta sem rodinhas, me treinou por um tempo até que eu estivesse pronto, jamais esquecerei a sensação. Sonhava com uma bicicleta, meus colegas todos tinham, meu pai me deu de presente, mas nunca foi muito presente, mas, por outro lado, meu tio estava sempre comigo, foi o meu herói da vida, quem é o super-homem para ser chamado de herói comparado a ele. A presença dele me deixava tão seguro, tinha vários bordões, às vezes gostava de colocar entonação nas últimas palavras para ser engraçado, e como episódios de chaves, que já estamos cansados de saber o que vai acontecer, mas no final sempre me arrancava rizadas, sempre, assim era a vida com ele, mais alegre. 

Era um homem incrível, mil em um, pedreiro, eletricista, pintor, marceneiro, auxiliar administrativo e até "mãe" ele foi, acredita? Quando pegou sua esposa o traindo, não fez nada a não ser entregá-la as suas malas e dizer que estava tudo acabado, ela foi embora sem pensar duas vezes com seu amante e o abandonou com seus três filhos, sendo o mais novo com apensas dois anos e meio, mas meu tio erguendo a cabeça, engolindo o golpe, criou os três com muita dignidade, mas como a vida não é justa, nem pode ver os netos.

Ele tinha um dom incrível, talvez um que ninguém percebia, mas que o diferia das outras pessoas, ele tinha o dom de ouvir, era sentar ao seu lado e ele te ouvia por horas, com empolgação sobre os mais variados assuntos, fala pouco, ouvia mais... a tio como você era incrível. Até que aquela terrível câncer covarde e silencioso te pegou de surpresa, foi difícil ver o meu herói definhando, até aquele fatídico dia chegou, a cirurgia, me doí lembrar quando ele me olhou e disse: "estou com medo de não voltar". Pela primeira vez vi medo em seus olhos, o encorajei é claro. Me sinto aliviado porque disse que o ama.

Não queria dizer isso, mas ele foi e nunca mais voltou. Saudades daquele rizada, das brincadeiras, da luz que ele emitia, da força que me dava, de ouvir músicas ou assistir filmes com o meu parceiro. Pensava que super-heróis não morriam, estava enganado.

Willian Nicácio 

22/05/2023

Willian Nicácio
Enviado por Willian Nicácio em 22/05/2023
Reeditado em 23/05/2023
Código do texto: T7794938
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