GOL LAÇO!
Recomeça o jogo. Nove jogadores em quadra desejam uma única coisa: o troféu do torneio interclasse. Sim, nove, pois tudo que um deles quer é fazer um gol e dedicar à garota para quem, até o final do primeiro tempo, o pretenso goleador fora praticamente invisível, pelo menos era o que ele pensava até que, nos minutos finais, uma bolada mudou toda a história.
O nome dele era Valdir. Franzino, baixinho, reservado, passava parte do seu tempo mergulhado nos livros. Mesmo durante os recreios, preferia a biblioteca à grande quadra poliesportiva tão disputada por todos. Naquela final, Valdir jogava como zagueiro, – prática normalizada entre os treinadores escalar para a zaga ou para o gol os, digamos, menos habilidosos com a pelota – a quadra estava lotada: 6ª série contra 9º ano, turma do grandalhão que sempre lhe tomava o lanche sob ameaça de uns croques.
Finalzinho do primeiro tempo, o grandalhão chuta em direção à meta, mas no meio do caminho tinha um atleta, tinha um atleta no meio do caminho... ele, Valdir, o zagueirão que evitou o gol do 9º ano. Teria sido o herói da partida não fosse um pequeno problema: a bola atingiu-lhe o estômago e, por reflexo, obrigou o menino a agarrá-la em plena área de defesa... PÊNALTIIIII... Risos da plateia, sonhos no chão...
“Que raiva, nunca mais jogo bola”, pensou ante a algazarra nas arquibancadas. O mundo desabou, seria o fim de uma carreira possivelmente promissora, a Seleção Brasileira decerto poderia estar dando adeus naquele instante ao craque que nos traria o hexacampeonato, mas em meio à chacota geral, um rosto demostrava empatia. Era ela, Lindalva, campeã de soletração do Fundamental 2.
Fôlego recuperado, pênalti convertido, todos ao vestiário...
Recomeça o jogo. Valdir, na quadra, aguarda uma chance de dar a volta por cima. E não é que a chance veio?
Final do segundo tempo... Dois a Dois no placar. Decisão nos pênaltis... Valdir era o último batedor do seu time... três a três no placar... O juiz apita, Valdir toma uma distância incomum, corre, chuta e... goooooool. A torcida vai à loucura. 6ª série campeã, mas o jovem herói não dava a mínima para estrelismo. Rapidíssimo correu para a torcida à procura de Lindalva, mas, para a sua decepção, não a encontrou. “Será que não viu o gol que fiz para ela?”, pensou.
De tristeza, o craque do jogo, nem volta olímpica quis dar para comemorar a vitória improvável da zebra da competição. “Que raiva, nunca mais jogo bola”, pensou ante a ausência de Lindalva nas arquibancadas. Descobriu, no entanto, do outro lado da quadra, próximo à linha lateral, a sua menina dos olhos aplaudindo o desempenho dos campeões... Recomeça o jogo. Valdir respira fundo, toma coragem, aproxima-se de Lindalva e: “gostou do gol? Foi pra você”. A menina respondeu com brilho no olhar e tímidos sorrisos de agradecimento. Era o apito que faltava autorizando o último lance, o gol mais importante de todo o campeonato: Valdir se prepara, engole a timidez e faz o convite que há muito guardara para a primeira oportunidade: Quer ser meu par na quadrilha do ano que vem?