CONFISSÕES DE UM PALHAÇO
Sou palhaço desde sempre, pintar minha cara é rotina que cumpro com fé. Quando subo no picadeiro da vida. esqueço meus desenganos, meus infortúnios, meus tropeções, meus senões. Quando acaba o show não tiro meus sapatões, minhas calças largas, minha jaqueta espalhafatosa, nem minha bola vermelha que coloco no nariz. Muito pelo contrário. Quando toda a plateia for embora é que tudo vai acontecer de fato, porque ficarei só comigo mesmo em cena e ninguém mais. Então poderei gargalhar até sumir todo fôlego, fazer todas estrepolias que der na telha, errar meu roteiro a toda hora e me aplaudir até as mãos ficarem em carne-viva. Vou poder berrar, chutar, catapimbar no chão, vou mesmo. Vou poder me lambuzar de serragem, errar nas falas, no querer-bem, no sonhar, no que quiser. Vou poder ir embora sem dar tchau, virar do avesso o cenário, tirar o cheiro de suor e até chamar Deus do que bem entender. Será a hora de viver meus palhaços, todos eles, até desmontar o circo, voltando a procurar outro terreno baldio pra erguer a lona de novo. E recomeçar a próxima sessão.