Cicatrizes (BVIW)
Com quantas canetas se escreve um livro? Com tantas quantas forem necessárias para registrar tudo que está dentro e o restante de fora, que cutuca, incomoda. E para quem tem implicância com rasuras, como eu, não vale corretivos ou borrões. Caneta tem disso: marca e não permite correções, deixa cicatrizes no papel e, por isso, é provável que incomode tanto. É um pouco da vida, mostrando-se a quem escreve. Assim talvez, usar lápis seja permissividade de quem é ousado também: que arrisca errar e acertar, apagar e reescrever, mas com a benção de deixar menos marcas no registro, embora continue permitindo-se ser quem é.
Devaneio ou realidade, cada linha conta, seja no papel ou na tela. Esta última permite apagar com ampla facilidade: volta, deleta, muda, reescreve. Outra divagação sobre a vida, um despertar para a mudança de ideia e para os recomeços necessários do viver.
Sempre me incomodou as cenas de filme em que quem escreve - por bloqueio criativo - amassa inúmeras folhas de papel e descarta o que está ávido por se desenvolver. Gera lixo: físico e emocional. São cicatrizes literárias, que como as da vida, não se desfazem facilmente. As bolinhas de papel amassadas não voltam a ser o que eram; algumas oportunidades na vida, também não e, em analogia, foi assim que estive na praia esta semana. Ignorei alguns olhares de reprovação (incluindo o meu) e exibi na areia todas as histórias e cicatrizes do meu corpo (im)perfeito.
09/05/23