Voltando para casa
Estou voltando para casa, olhando a paisagem morta da noite escura e silenciosa através da janela do ônibus. As luzes dançam com as sombras, os carros passam mudos como máquinas inúteis se movendo no asfalto. Mergulhado na escuridão quente e confortável do ônibus, meu coração está frio como a noite lá fora. Minha mente é um caos sem descanso. A música não atravessa minha alma esta noite. Nenhuma arte ou beleza fugidia da paisagem prende minha atenção. Estou imerso em minhas próprias profundezas. Uma dor inquieta me perturba, um desespero discreto, porém incômodo como um cano de revólver na cabeça. Nesses dias eu vegeto entre o tédio e uma vaga luz de sanidade que não me deixa cegar por completo na escuridão do meu desassossego. Durante a viagem parece que estou indo noite a dentro no vazio do mundo mergulhado nas trevas. As conversas ao meu redor parecem sussurros distantes e agonizantes, enquanto o ônibus atravessa a noite como um sonho alucinado. O dia foi ruim e me sinto tão perdido na minha solidão que tudo ao meu redor parece coisa distante e sem vida. A tristeza, a dor, o desespero são coisas que você sente sozinho, onde nenhuma palavra ou nenhum olhar alcança. Até porque ninguém se importa, ninguém enxerga você na multidão, na insanidade barulhenta do mundo. Eu pensava nisso naquele momento. Em quão miseravelmente só eu estou. Ninguém pode fazer nada por mim e quão pouco eu tenho a fazer por mim mesmo a não ser abandonar-me ao fluxo dos acontecimentos. A minha vida têm sido uma mutilação constante em minha sanidade. O pior de tudo é que não há quem eu possa culpar por estar no fundo do poço. Se houvesse algo ou alguém para culpar, minha consciência dormiria tranquila. Transformar a si mesmo em um mártir é a saída dos miseráveis. O cachorro lambe suas próprias feridas para curar-se. Assim fazemos, quando podemos. Me sinto insano e impotente às vezes - como me sinto agora. Abismado em pensamentos difusos e inúteis, eu vejo a noite passando como um filme rapidamente através da janela. Não há ninguém com quem eu possa conversar, pois sinto um abismo entre mim e os outros. Penso apenas em chegar em casa para fazer uma refeição e dormir para esquecer dos outros e de mim mesmo.
Descendo do ônibus, eu atravessou a multidão e vou andando, sentindo os pingos frios de uma chuva fina e nevoenta. Vou para casa, finalmente...