RELÓGIOS
Acostumados que somos em fazer tudo o que queremos a qualquer momento, nem nos damos conta de que o passar do tempo vai impondo as limitações que eu muitas vezes ignoro e por isso sofro as consequências.
Fiquei velho como invariavelmente ficam todos aqueles que deixam para morrer amanhã...
Normalmente não sinto as limitações da idade nem fazem parte do meu repertório de assuntos as reclamações sobre as comorbidades comuns aos jurássicos da minha idade (farei 79 anos em agosto) e por conta disso, desse bem-estar geral, vez por outra sou vítima da minha falta de cuidado.
Afinal meu cérebro não tem noção de que envelheceu como todo o resto de mim.
Aconteceu nesta semana.
O relógio da cozinha parou.
Para alcança-lo eu deveria ter usado a escadinha, daquelas de três degraus, mas sem lembrar de que a musculatura esquelética precisa ser aquecida para fazer certos movimentos, na ponta dos pés, alonguei o braço, tirei o relógio e ao recolocá-lo na parede, senti a fisgada no meio das costas.
Dentre os milhões de ancestrais, de quem herdei os códons que compõem o meu DNA, possivelmente tem aqueles que, como eu, eram admiradores, usuários ou talvez fabricantes de relógios e trens.
Não me refiro aos mais modernos, embora goste muito de usá-los, mas os trens a vapor e os relógios mecânicos são fascinantes.
É difícil descrever a satisfação de uma viagem de trem ou de ter a exata noção do passar das horas a fim de garantir o cumprimento do horário aprazado que considero ser inegociável, sem exceções ou explicações por atrasos.
Meu poder aquisitivo não dá para ter trens, mas tenho uma coleçãozinha de relógios de algibeira e distribuídos por dentro de casa tenho três relógios de parede.
São desses modelos xingling bem baratos, mas que dão conta do recado e são tão econômicos que nem atentei para o fato de que a pilha daquele relógio estava instalada desde outubro do ano passado.
É isso mesmo. Eu anoto as datas das trocas das pilhas dos três relógios da casa.
Dos meus relógios, o que considero a joia da coroa é um Seiko5 de pulso, com sistema automático de corda e que nunca atrasou um minuto sequer desde que foi comprado há 50 anos numa loja, podre de chic, no térreo do Parahyba Palace Hotel, Praça Vidal de Negreiros, S/Nº no centro de João Pessoa/PB.
Uma curiosidade: ninguém saberá dizer onde fica essa praça em João Pessoa, mas se você perguntar onde é o Ponto 100 Réis, todo Paraibano além de ensinar como chegar, fará questão de leva-lo até lá, por ser povo bom e hospitaleiro duma cidade encantadora.
Agora, apesar dos analgésicos e anti-inflamatórios, cá estou curvado como um parêntese “)” enquanto espero voltar à posição normal...