A ARTE DE CRIAR TORNADOS
Que Vô Ventura é um artista não tenho dúvidas. Artista incompreendido, talvez, de arte desconhecida, é possível, um artista, a meu ver, no entanto. Busquei várias explicações no dicionário para o verbete “arte”, para explicar um pouco das artes de Vô Ventura, e justificar minha atribuição e para a descrição de uma de suas artes: a de criar tonados. Vejamos, então:
1. Aptidão inata para aplicar conhecimentos, usando talento ou habilidade, na demonstração de uma ideia, um pensamento; pode se referir também ao resultado dessa demonstração: no caso em questão, o tornado. Aí vem outra necessária explicação: o que é um tornado? De volta ao dicionário encontramos várias definições. A que nos interessa aqui é o redemoinho intenso e violento em forma de cone invertido que, girando de modo muito veloz, destrói quase tudo por onde passa.
2. Arte pode ser também a aptidão natural para realizar algo, perícia, talento ou habilidade para fazer algo. Aqui iremos nos referir ao talento para criar tornados.
3. Arte pode também se referir à criatividade humana que, sem intenções práticas, representa as experiências, individuais ou coletivas, por meio de uma interpretação ou impressão sensorial, emocional, afetiva, estética, etc. Criar tornados é uma arte que se enquadra nessa definição, pois não há intensões práticas no ato e pode-se chegar a interpretações emocionais.
Essas notas são suficientes para referenciar a arte de criar tornados, então vamos logo a algumas ações que podem ser realizadas, segundo o manual proposto pelo Vô Ventura. Vamos às ações sugeridas:
1. Para se iniciar nesta arte é preciso abrir espaços em sua mente para pensamentos incertos e ações inesperadas: quanto mais inesperados e imprevisíveis, melhor. A imprevisibilidade é a alma do negócio, ou melhor, da arte.
2. É preciso parar o tempo: tornados só aparecem após calmarias, naqueles momentos em que se esquece o instante anterior aos acontecimentos. Dominar o tempo é um dos requisitos dessa arte milenar. Os povos antigos eram mestres nela.
3. Não veja televisão se deseja criar tornados, esses não acontecem quando você está paralisado assistindo aqueles programas tediosos da TV. Os canais de televisão são os principais manipuladores da mente dos candidatos à arte de criar tornados.
4. Estimule o frio na barriga, esse é um ótimo indicador de possibilidades de surgimento de novos tornados.
5. Cante no chuveiro, ou em qualquer outro lugar, sempre que tiver vontade. Se você canta bem ou canta mal, não tem importância. A música cantada com reais sentimentos irão criar tornados em algum lugar.
6. Se for do sexo feminino sempre saia de casa bonita: de salto bem alto e roupas que lhe vestem bem, sentindo-se a rainha da bala chita. Pode ser que escute assobios. Mas assobios e bater de asas de borboletas provocam tornados em algum lugar do planeta, segundo a teoria do caos.
7. Se for do sexo masculino, assobie quando vir uma mulher com ar de felicidade caminhando na rua. Mas não a incomode, assédio não produz tornados. O assédio produz ondas gigantes capazes de naufragar navios.
8. Seja incondicionalmente feliz: a felicidade provoca alterações orgânicas em algumas pessoas de nossa vizinhança, alterações essas que aumentam a probabilidade de surgimento de tornados exatamente por serem imprevisíveis (seja feliz por querer). Pessoas felizes são completamente imprevisíveis, fundamental para a arte de criar tornados.
9. Ponha um gosto de amor na tua boca, nas tuas mãos, em teus gestos. O amor é essencial para a criação de tornados, pois ele faz surgir a quela tempestade boa dentro da gente.
10. Se caminha com fé em si mesmo, bons tornados serão criados.
Você pode até pensar que tornados são destruidores. Sim, mas sempre acabam e sempre é possível reconstruir. Mas aí já é outra arte, a arte do recomeço, da reconstrução. Depois do tornado, sempre seremos outra pessoa, em geral bem melhor que a anterior. Portanto, segundo Vô Ventura, é melhor se esmerar na arte de criar tornados.