OS DOZE FILHOS DE JOSÉ E MARIA

– É, menino, o dia todos gritando pela casa. Afinal de contas são doze, assim como os apóstolos de Cristo.

– Maria faz Tiago calar a boca e manda João parar de bater no Pedro, assim não é possível. Por onde anda Mateus? Manda ele ir buscar na mercearia do Nicanor um pacote de arroz e um de feijão. André, passa no açougue de Lázaro e pega a carne que já deixei paga.

– José, estou grávida!

– Mas como, Maria! Já temos onze filhos! Você esqueceu de tomar os comprimidos?

– Tenho tomado todos os dias, posso ter dúvida a respeito daquele dia em que Judas Tadeu ficou doente e passei o dia no hospital.

– Mas isso não é motivo pra justificar uma gravidez.

A notícia da gravidez de Maria foi para José motivo de inquietação, mais um filho, somado aos onzes, agora são doze. Tinha mesmo é que si cumprir a profecia.

– Depois de ter nascido o sétimo, bem que compadre Zaqueu dizia, você vai escolhendo o nome de acordo com os apóstolos de Cristo, lembre-se que são doze.

– Felipe, vai na casa da tia Madalena e leva esse bilhete e espere a resposta.

Minutos depois, Madalena atende a solicitação do bilhete que era convidando a comadre para uma conversa.

– Bença, tia,

– Deus lhe abençoe, Bartolomeu, a você também Simão.

– Meninos, vão brincar, que conversa de adulto não é coisa para vocês ficarem escutando, avise para Zelote e Tomé aguardarem a saída da comadre.

Nada acontecia na vida de Maria que Madalena não participasse. Assim também é com Madalena, amigas, comadres e confidentes viviam uma enxugando as lágrimas da outra, fosse nos momentos de alegria ou de tristeza.

– É mais um filho, comadre. Quando Pedro nasce, era para ter ligado as trompas, mas José disse que com o dinheiro que tinha não dava para pagar a cirurgia.

– E o compadre como recebeu a notícia?

– Parece não querer nem saber, tem andado pelos cantos, sem dizer uma palavra. Isso tem me preocupado, pois ele sempre recebeu a notícia dos outros com fanfarra e muita festa. Levantava as mãos aos céus e agradecia com orações, mais um filho, presente de Deus.

–- Isso não é motivo de preocupação, comadre, é só o choque da notícia, logo ele vai ver que onde come onze pode-se dividir por doze.

– Que suas palavras sejam abençoadas.

João Batista, primo de José, ao saber da notícia, foi logo saber se era verdade:

– Que notícia boa é essa que acabei de sabe? Não se esqueça da promessa que me fez, pois esse menino vai ser meu afilhado.

– Assim que o menino nascer, você é quem vai levar nas águas, para que não morra pagão.

Sentados à mesa, os onze esperam a chegada do pai, que nunca deixava de estar presente para agradecer o pão de cada dia.

Mateus, notando o semblante triste e o olhar distante no rosto da mãe, olhou para os irmãos para saber se mas algum também percebia.

Maria, sempre que sentava à mesa, olhava seus filhos com ternura e doçura de uma mãe zelosa. Parecia falar com a voz do mundo, e pedir bênção para seus.

– Mãe, por onde anda o pai? Por que demora, quando é sempre o primeiro a sentar na mesa?

– Quem sabe o serviço hoje exigiu dele mais um tempo para terminar um móvel.

– Pedro, hoje é quem vai fazer a oração de agradecimento.

Todos uniram as mãos, fecharam os olhos e curvaram a cabeça.

– Que o nosso Deus possa sempre nos dar a graça de repartir o pão, com o trabalho de nossas mãos e sermos dignos da sua bondade e que o nosso novo irmão possa multiplicar, o que haveremos de comer e beber. O Senhor esteja com conosco, abençoando o ventre de Maria, amém.

– Maria, o que disse o Dr. Nicodemos dessas dores?

– Pediu uma ressonância, ele ainda tem dúvida para expressar sua opinião, fiz todos os exames preventivos, sempre na data marcada, com resultado satisfatório. O crescimento, as batidas cardíacas e o peso, nada de irregular. Amanhã já estou entrando no nono mês, a data prevista para o parto, vai ser no final do mês de dezembro, caso o exame não apresente anomalia.

–- José, nosso filho tá bem?

– Descanse, Maria, você é uma mulher guerreira, já venceu onze batalhas. Deus está contigo.

As palavras de José deixaram em Maria uma reflexão de angústia e dor, pressentia que algo tinha acontecido ao seu filho recém-nascido.

– Madalena, você viu meu filho, ele está bem, não sei por que ninguém me dá notícias.

– Descanse, Maria, somente Deus conhece os seus mistérios.

Com um olhar no vazio, a lágrima desceu do rosto de Maria ao ver a imagem do seu filho acenando e sorrindo num adeus eterno.

Castro Rosas
Enviado por Castro Rosas em 03/05/2023
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