DR. FULANO
Estou no laboratório aguardando uma autorização do plano de saúde.
Entra uma figura vestida ao estilo padrinho de casamento. Vozeirão, dirige-se à atendente do primeiro guichê após cruzar o totem de senhas invisível aos seus olhos de lince:
-Bom-dia! Eu sou o Dr. Fulano de tal e hoje dediquei um minuto do meu tempo para proceder a um procedimento com vistas a averiguar a saúde. Temo-a periclitante. Solicito a máxima urgência, tendo em conta as audiências que me aguardam o retorno. Externo minha gratidão se o puderes obsequiar-me.
- Senhor, por favor retire uma senha e aguarde atendimento.
Atônito com a negativa, inquiriu a moça:
-Você não prestou ouvidos atentos? Meu nome é Dr. Fulano de tal e estou com pressa.
Habilmente treinada, a ruivinha deu duas pestanejadas e reforçou o protocolo:
-Senhor, entendo. Mas precisa pegar a senha e aguardar atendimento.
- Senhora, uma questão de ordem. Tenho comigo os documentos que corroboram a real e urgente necessidade de demandar por exames de sangue nesta instituição.
-Sim, senhor. Infelizmente esse é o procedimento.
-Defenda.
-O senhor é portador de necessidades especiais?
-Não.
-Idoso?
-Legalmente ainda não.
-Porta em sua companhia algum menor/dependente em idade de colo?
-Não há ninguém assim sob minha tutela.
- Autista?
- Não.
- Irrefutavelmente não está gestante. Há controvérsias?
- Podemos ultrapassar esses prolegômenos. Data vênia, exijo falar com seu superior.
Se seu problema de saúde era tempo e não algo sinalizável em um hemograma com contagem de plaquetas, de nada adiantaria recorrer à segunda instância:
-Senhor, compreendo. Para falar com a gerente, o senhor precisa retirar uma senha e aguardar ser chamado no painel.
Perda de objeto.
Atropelando a máquina cuspidora de senhas, o homem deixa o recinto exalando pelas narinas bufantes a moral deveras danificada...
Sobre aquela autorização, acredito piamente que vou precisar de um bom advogado.