O Equilibrista das Américas
Na relação dos circos - bons, medianos e renquéns - que visitavam as cidades do interior - Pitangui compreendido - e os tempos se incumbiram de mandar para a lona, o Gran Portugal Circus vinha em um distante segundo lugar. À frente de todos vinha o Barnum Circus, e bote frente nisso. E foi o diferencial. A ponto de se dar ao luxo de montar aquela estrutura toda
- uma complexa, mas rápida ereção - dar espetáculo por dois dias, desmontar tudo e se mandar, de burras cheias, pra outra cidade, já com a fama chegada à sua frente.
O Gran Portugal ficava em segundo, e quem sabe o Irmãos Elias em terceiro, mais por assiduidade - porque todos os demais eram igualmente fracos, ainda que prestigiados por aquela gente ávida de ver a eterna repetição de novidades, mais acessíveis que o cinema, ainda que requentadas.
Assim, mais do que a programação, o que se ressaltava no Gran Portugal era a lona nova, quase impecável, letreiros bonitos, vistosos. De trapezistas a palhaços, passando por contorcionistas, e algum esboço de encenação, pouca coisa de distinta permaneceria na memória.
Mas quando anunciaram pomposamente O Equilibrista das Américas, a platéia gelou em silêncio ao ver aquela figura: um senhor já bem encanecido, de escasso aspecto performático, embora de vestes bem elegantes para o que se propunha - que era sentar sobre uma cadeira equilibrando-se sobre um balanço em movimente, e dar uma de saltimbanco com umas bolas de sinuca. Primeiro três, depois quatro, cinco...
Tudo ia funcionando bem até entrar a quinta bola... e caírem todas as outras, deixando o equilibrista pálido, agarrado nas cordas do balanço. E a vaia correu solta. O homem se indignou. Protestou. Mas não recomeçou. A vaia aumentou, até que retumbante, o artista, literalmente, se desequilibrou...zoou, e rumo ao camarim se enveredou... E no dia seguinte aquele número já não constou. A bela lona, o circo, e o equilibrista, sem dar pista, tudo se mandou.
E o que ficou foi aquela lembrança aterradora de uma clássica cena de O Ébrio, de Vicente Celestino, em que o protagonista, no derradeiro tombo de sua outrora brilhante carreira, leva ..." uma vaia em pleno picadeiro de um circo....e nunca mais fui nada..."