Deixou o amor entrar na caducidade
Sentia as pernas cambalear. Trôpego, seu sinistro e tenso olhar se perdia no vazio. Chegando aos 50, já parecia sentir o peso dos 80 lhe fustigando impiedosamente o lombo.
Ao longo da vida, sempre estivera apoiado na Esperança. Um amanhã suave. Um amanhã melhor. O amor verdadeiro lhe esperando na próxima esquina.
Mas os dias se ressecaram, a flacidez perpetuando a pele desgastada. Agora, o olhar enrijecido não enxergava mais o futuro. Nada via além de alguns poucos centímetros caóticos em sua frente. Uma luz lúgubre contornando a escassez de cores e formas.
Ouvi uma música que falava de amor que refrão dizia assim:
Seu semblante me rejuvenesce
Como és carinhosa, sua presença me faz bem!!!
E então percebeu o quanto estava só, que seu corpo deixou de receber o “adubo” do romantismo. Ficou cabisbaixo, descontente e estagnado, saiu na porta da cozinha, olha longamente para horizonte.
Havia tanto amor em seu peito, porém, um amor que nunca fora dividido. Uma vida inteira na espera da pessoa especial que seria seu alvo incondicional. Tanto amor mantido, obrigatoriamente, em estado letárgico. Anos e anos em desuso, ressecamento das artérias, oclusão das sensações.
Amor em desuso, eternamente estocado, certo dia, venceu o prazo de validade.
Deteriorou-se.
E a desesperança fez-se morada. Não havia mais estímulos. Não havia mais intensidades como força motriz. Os pensamentos não mais planejavam uma vida a dois. Era só ele, ele e aquela velha estrada vazia que percorrera toda a vida.
Certo dia, saiu de casa e nunca mais voltou. Apesar das buscas de parentes e amigos jamais foi encontrado.
E nem poderia. Afinal, enquanto se arrastava inerte pelas estradas, nem ele mesmo sabia quem era ou onde se encontrava.