Leitor de nó na garganta e lágrimas fáceis

 

 

Legal, quero ver alguém coisar este troço! Vou pôr minhas dúvidas numa palavra-valise e despachá-las, para bem longe, a bordo de uma palavra-ônibus. Quero ver quem as localizará e conduzirá coercitivamente, sem que antes tenham deixado injustificadamente de atender à intimação prévia que, à evidência, não se lhes fez.

 

Atenção! Isso não é mensagem cifrada. É, de brincadeira, mera abonação literária de palavra-ônibus e palavra-valise, mais para criticar, como sempre faço, as ilegais conduções coercitivas sem intimação prévia, aborto jurídico dos tempos modernos, felizmente suspenso por liminar. Urge, portanto, que se confirme o que antes era até inimaginável, porque inteiramente desnecessário, em face dos princípios mais elementares do direito, a suspensão definitiva da coisa feia.

 

Não quero falar da greve dos caminhoneiros, da política, do direito, de religião ou de outros tantos assuntos. Ando a desgostar disso, já faz tempo. Alguns dos tais assuntos, aliás, eu faço mesmo é detestar. Embora saiba que muitos gostam, por exemplo, de política e politicagem, de religião e religiosidade e, assim – por causa da própria cobiça por que cada qual é tentado –, não gostam do que escrevo, isso não me incomoda. Há quem goste, o que me basta.

 

Quando me sento para escrever, gosto de falar, sempre de passagem, é de literatura, poesia, crônica, bucolismo. Escrevo por gosto literário, não para sobreviver. Como meio de subsistência, faço-o tão somente ao escrever como advogado as petições e demais manifestações jurídicas. Busco no cronicar é lazer, descontração, prazer literário (mais os meus do que os dos outros, evidentemente). Sou chato? Talvez. E daí?

 

Com efeito, revisitei hoje – não porque sou chato, mas por prazer literário – o volume 1 de Magistrando a Língua Portuguesa, de Rose Sordi, e, fazendo-o, reli a crônica Carta aberta a Lourenço Diaféria, de Luís Alberto Meyer, lida faz alguns anos. Eu, aliás, já me esquecera de que essa crônica foi escrita especialmente para o livro, um pormenor que, sobremaneira, chamou minha atenção quando a li pela primeira vez. Está escrito, logo abaixo do último parágrafo, entre parênteses: “texto especialmente escrito para este livro”. Achei isso o máximo.

 

Escrita para o livro, houve previamente, é certo, um honroso convite que foi prontamente aceito, o que creio ser fruto de bela amizade entre os autores, Rose Sordi e Luís Alberto Meyer. Venturosa ideia de Rose Sordi, pois a crônica, que foi escrita como se fora a carta de um leitor ao escritor Lourenço Diaféria, é linda e, de forma simples, mas admirável, ensina muito de literatura e da existência humana ao leitor atento. Não sem razão, menciona – de passagem, como gosto de fazer – a leitura de Morte sem colete, livro de crônicas de Lourenço Diaféria.

 

À guisa de amostra grátis para quem não conhece, vai este trecho (da Carta aberta, claro): “Sou um leitor de nó na garganta e lágrimas fáceis. Sinto nas palavras, por outros escritas, aquilo tudo que está dentro de mim, que queria expressar e não consigo; que sinto e não sei transmitir”, diz o personagem-leitor missivista.

 

Pois bem, seu moço e dona moça. Para rematar, esta bela passagem de Ricardo Gondim, que a escreveu bem recentemente na lindíssima crônica lírico-existencial Como cheguei onde estou: “Anseio conjugar verbos alegres e pungentes. Quero advérbios sucintos e adjetivos significativos. No fim de tudo, se minha redação produzir vida e esperança, estarei satisfeito.”

 

Ganhei o dia!