O Samba Enredo do Atraso Brasileiro
Eu detesto carnaval, nesse ano de 2018 estou recluso em casa, longe das aglutinações, mas a imagem do corrupto presidente Temer como vampiro neoliberalista no desfile da Paraiso da Tuiuti reforça a minha concepção de que a arte é um espelho para a reflexão da sociedade e está muito além do mero entretenimento.
Em plena época de músicas sertanojas e funks, no período carnavalesco, de aparente pão em circo em que a maioria das pessoas não se preocupam com o abismo social, essa escola de samba usa o sambódromo para fazer uma crítica social - um retrato fiel do drama que se encontra o Brasil.
Estabelecendo um nexo da escravidão colonial com a perda dos direitos trabalhistas, passistas com carteiras de trabalho dilapidadas, os coxinhas de classe média como fantoches de manipulação política e a melhor imagem do dia: o vampiro neoliberal Temer cheio de dinheiro e sua cara imunda. O enredo carnavalesco mostra de forma escancarada como os direitos sociais foram tirados da população por parte dos poderosos... Como o Brasil interrompeu o seu processo civilizatório ao aceitar que direitos trabalhistas fossem vergonhosamente tirados de nós.
Somos as mesmas pessoas que acabaram de sair dos quilombos – apenas formalmente livres. Na prática o que existe são trabalhos de baixa remuneração e sem uma série de direitos sociais. A música que era o samba enredo acidamente criticava: meu deus, meu deus, está extinta a escravidão? Não! Estava entre os negros açoitados no século XIX, mas permanece hoje entre a classe média. A diferença é que atualmente os cativos sonham fazer parte do grupo dos seus opressores.
Essa é a função da arte - causar reflexão, incomodar os poderosos. O desfile fez isso e muito bem. Eu fiquei tão impactado que fui assistir todo o desfile e percebi o quanto os repórteres da tv Globo ficaram incomodados, embasbacados por não poderem explicar em detalhes todo o conteúdo ali mostrado. Afinal de contas, eles não vão assumir publicamente que a grande imprensa é parte da elite que nos impõe a escravidão social.
Aplausos para essa comunidade carioca e que isso incomode a classe média que ajudou em todo esse desfile de torpezas que vivemos. A escola tirou nota 10 em tudo! E se caso não ganhe na apuração, com certeza já caiu no gosto popular, lavou a alma do povo brasileiro.
12.02.2018