O PRÍNCIPE VIROU UM SAPO

Assim como acontece com a maioria das meninas da minha geração, eu também cresci ouvindo histórias de reis, rainhas, sapos que se transformam em príncipes e heróis que salvam mocinhas colocadas em perigo por terríveis vilões. Os contos de fadas marcaram a minha história de vida e a de milhares de crianças da minha geração. Cresci acreditando que o bem sempre vence o mal, que meninas boazinhas vão para o céu e que em cada mulher vive uma princesa que em algum momento de sua vida será resgatada por um linde príncipe montado em um cavalo branco, o qual a levará para um mundo mágico de amor e felicidade.

Depois de adulta percebi que toda esta fantasia não passa de uma grande e cruel enganação imposta às crianças do sexo feminino. Isto porque, enquanto as meninas são preparadas para serem princesas, esposas recatadas e mães devotadas aos seus futuros filhos, os meninos não são preparados e tampouco estão dispostos a assumir a figura do príncipe, de marido responsável e pai amoroso. É claro que existem as exceções, embora raras.

Felizmente caí logo na real, porém, não tive como evitar que um príncipe cruzasse o meu caminho. Diferentemente dos contos de fada, este príncipe não me apareceu montado em um cavalo branco, mas em um SP-2 cor de prata, carro que era o que havia de mais moderno em veículos esportivos na época da minha juventude.

Nosso encontro ocorreu durante um baile realizado na escola onde eu fazia o Ensino Médio, no bairro do Alecrim. Naquela época era natural a realização de festas nas dependências das escolas. Era uma forma de os estudantes angariarem recursos para as festas de formatura.

Eu fui à festa com algumas amigas, já que esta seria animada pelo grupo musical de maior sucesso em Natal – a Banda Impacto Cinco – pioneira em rock na Capital Potiguar. Todas estávamos animadas, porque uma festa com a tal banda era sucesso garantido. O branco era a cor predominante nas nossas roupas, por causa da luz negra, que dava um destaque especial ao branco.

Chegamos à escola e enquanto uma das meninas comprava nossos ingressos, tive minha atenção despertada pelo rapaz que descia do SP-2 estrategicamente estacionado em frente ao prédio da minha escola. Quando o meu olhar cruzou com o dele, não tive a menor dúvida: Ele era mesmo um príncipe saído dos contos de fada que eu ouvira e lera durante a minha infância e adolescência. O rapaz tinha os olhos mais lindos que os meus já viram: Tinha os olhos profundos, penetrantes, mas ternos. Eu sentia como se o mundo tivesse parado e não conseguia tirar meus olhos dele.

O sujeito me parecia perfeito demais. Um belo exemplar de príncipe com os cabelos um pouco longos e encaracolados, mas a voz dele foi o que conquistou de vez o meu coração. Foi justamente a voz do príncipe que fez um carrilhão de sinos tocar dentro da minha cabeça e do meu coração. O barulho foi tão grande, que acabou abafando o som da festa e eu me senti sendo transportada para um paraíso onde não havia ninguém mais além de nós dois.

Ele se aproximou e de maneira extremamente gentil, me convidou para dançar. Enquanto a gente rodopiava pelo salão embalados pelo som da música, eu me sentia flutuando em uma nuvem cor-de-rosa. O príncipe dançava bem, era bonito e acima de tudo, era muito cheiroso, educado e atencioso. Enfim, tinha todas as qualidades que eu imaginava fazer parte da realeza.

Ao fim da festa, ele me levou em casa prometendo voltar no dia seguinte e voltou para conhecer minha família e pedir autorização para me namorar, como era costume na época. Minha família concordou com o pedido e gostou dele.

Pietro – era o nome do príncipe. Ele era filho de um italiano proprietário de uma rede de lojas, no bairro da Ribeira, enquanto eu era filha de um músico, servidor público da Prefeitura Municipal de João Câmara. Para nós não havia diferença de classe e nosso namoro estava firme igual a uma rocha. Pelo menos era assim que eu pensava.

Depois de três anos vivendo uma história de conto de fadas, o pai dele morreu e Lorenzo, o filho mais velho passou a gerenciar os negócios da família. Lorenzo não via com bons olhos o romance do irmão com uma moça de origem simples, do interior. Começou a pressionar Pietro a colocar um ponto final naquele namoro.

A pressão foi muito grande e o amor que eu imaginara ser forte igual a uma rocha não era tão forte assim e então o romance terminou, mas não sem dor e sofrimento profundo. Soube anos depois, que Pietro se casou com uma moça rica, filha de um empresário do ramo de hotelaria, no Rio de Janeiro.

O normal nos contos de fadas é um sapo virar príncipe. Neste caso, aquele a quem eu considerava um príncipe, se transformou em um sapo apenas para contrariar este conto de fadas.