Adeus!

Uma vez eu tive um gato, o Matteo, meu gato amarelo de pelo curto. Ele apareceu no jardim da casa que tive nas montanhas, magro, miando, cheio de fome, a ponto de comer um pedaço de pão que eu joguei para ele (imagina, dar pão para gato... só mesmo uma pessoa sem noção de como tratar animais faria isso). Pois bem, dei leite depois, comprei ração, sachês com comidinha especial e ele engordou, se aproximou de mim e não foi mais embora. Seguia-me para todos os lados, quando eu estava por lá, feito um cachorrinho (eu era uma pessoa mais de cachorro, confesso, embora não tivesse um). Ele não gostava de ficar dentro da casa, talvez porque eu não o deixasse subir na mesa, na cama, no sofá, essas coisas antipáticas de gente com alergia a pelo e mania de limpeza, mas, do meu jeito, eu o amava e ele a mim. Ele não vinha comigo para meu apartamento no Rio, pois era um gato livre e percorria todo o condomínio onde ficava minha casa, vindo dormir lá, à noite. Um dia o caseiro me ligou e me disse que o tinha achado morto embaixo de uma árvore, no meu jardim. Fiquei muito triste, chorei, mas aceitei e dei graças a Deus de não ter sido eu a encontrá-lo sem vida.

Há pouco mais de seis anos, minha filha adotou um gatinho, o Brad, que chegou pequenininho, uma graça. Eu não sou do tipo de pessoa que fica grudada, abraçando e beijando bichinhos, mas me afeiçoei muito a ele, principalmente porque, de vez em quando, eu servia de babá dele, quando minha filha viajava. Eu ia na casa dela (minha vizinha), fazia companhia a ele, de madrugada, e lá ficava um tempão, brincando com ele... alimentava-o, limpava o banheiro dele (a caixa de areia), trocava a água. Um dia fiz uma casa de papelão para ele, com uma caixa grande que encontrei nas escadas do meu prédio, com janela e porta e ele adorou... desde então a casa da minha filha ficou cheia de caixas e bolsas de papel, porque ele adorava ficar dentro delas.

Hoje ele nos deixou. Acordou, miou na porta do quarto da minha filha para chamá-la, comeu a ração dele, bebeu água... parecia normal, mas minha neta o encontrou, à tarde, no escritório... morto. Imagino o choque que ela teve... era totalmente apaixonada por ele... chegava a chateá-lo de tanto abraçá-lo e beijá-lo e ele ficava miando para se desvencilhar dela. Meu genro que é médico até respiração boca a boca fez, além de massagem cardíaca… levou seu corpinho ao veterinário que constatou edema pulmonar como causa mortis.

Tenho que dizer que não sabia que o amava tanto... estou até agora chorando, enquanto escrevo esta crônica... sua imagem diante dos meus olhos, com aquela pelagem farta cinza escuro e as várias manchas brancas que tinha na barriga e no nariz, aquele rabo de espanador...tão lindo ele, com aqueles olhos verdes tão carinhosos... era um lorde, um charme só... de uma gentileza irresistível. Esperava quem chegava, sentado no aparador ao lado da porta e miava baixinho para nos cumprimentar. Era um grude com minha filha que, depois da pandemia, passou a trabalhar em home office durante dois ou três dias na semana e ele ficava com ela, no espaldar da cadeira em que ela trabalhava... às vezes se enroscava em seu pescoço, como se fosse uma estola viva e ali ficava, tranquilo e contente. Quando Antônia, nossa secretária do lar, chegava, ele a acompanhava em todas as tarefas...o mais engraçado era quando ele a ajudava a estender roupas no varal. Subia nele e ficava mexendo no cabelo dela, com a patinha, à medida que ela ia preenchendo as varetas com roupas e colocando os prendedores.

Fico imaginando: será que gatos têm alma? Acho que devem ter um céu particular junto com o dos cachorros e de outros bichos onde seus espíritos devem conviver em paz. Com certeza o Brad tinha alma, ou, pelo menos, uma aura, e a dele era muito radiante e poderosa, pois se fazia amado por quem o conhecesse e também retribuía as atenções que recebia com muito amor e elegância. Não consigo tirá-lo da cabeça, e olha que ele não vivia comigo... não era meu. Acho que vai ficar um vazio imenso naquela casa, onde tudo vai lembrá-lo: seus brinquedinhos, a fonte elétrica, para que pudessem beber sempre água fresca, a prateleira que foi instalada na parede para que se exercitassem... até o tapete da porta que tem três gatinhos e a frase Família Gatos. Falei no plural sim porque há uma outra gatinha lá, a Luna Mia, que foi adotada uns dois ou três anos depois do Brad, mas ela não tem o carisma que ele tinha... é arisca, não se deixa acarinhar facilmente, vive fugindo e se escondendo... linda também, mas muito na dela, sem querer contato com os outros, nem mesmo com os donos... é amada, claro, mas o Brad era especial. Minha neta, a Letícia, a pega na marra, mas logo que pode, ela foge... a explicação para esse jeito de ser dela é que ela foi maltratada e viu a própria mãe morrer, segundo a Letícia, ou segundo a imaginação dela que adora gatos.

Agora é viver esse luto que, confesso, não imaginava que seria tão intenso porque, nem quando o meu gato Matteo morreu me senti tão triste, tão devastada e chorei tanto assim. O Brad partiu hoje, numa Sexta-Feira Santa, Dia da Paixão de Cristo... vai ver ele era mesmo tão especial que Jesus o chamou para fazer-lhe companhia. Ele vai fazer muita falta... deixou um vazio imenso. Que Deus conforte minha neta, minha filha e meu genro... e que aquele gatinho fofo, lindo, doce, amigo e companheiro seja feliz lá no céu dos gatos para onde foi!

Só sei que ele trouxe muitas alegrias e muito amor para nossas vidas... fica a imensa saudade.

Ouvindo GOODBYE (Kenny Rogers) Tradução

https://youtu.be/2UYKo51HwyQ\

Do baú

(quando o Brad precisou ser operado)

PRECE PARA O GATO BRAD

Não sei se existem preces para gatos,

Mas estou aceitando, de fato,

Que rezem pelo nosso Brad.

A gente tanta coisa pede,

Mas neste momento o que queremos

É que ele se cure e não fique mais doente...

Que ele volte a ser contente,

Correndo, pulando, dormindo na pia...

Que volte a nos dar alegria.

Que ganhe mais uns quilinhos

E fique de novo gordinho.

Rezem um Pai Nosso, uma Ave Maria!

Que ele volte a passear

Com seu belo rabo espanador

Que volte a ronronar, a aprontar

E a subir no nosso colo, pedindo amor.

05/03/2018