Castigo

Hoje é Sexta-Feira da Paixão, ou Sexta-Feira Santa, ou Sexta-Feira Maior.

Não se sabe de certeza, que a grande mídia, na pessoa enciclopédica da Wikipédia, ainda não decidiu. Mas essa indecisão é perdoável, ainda mais em uma Sexta-Feira da Paixão, ou Sexta-Feira Santa, ou Sexta-Feira Maior.

Em relação às sextas-feiras comuns, esta sexta-feira diferencia-se pelas recomendações e feriado. Do feriado, sempre gostei, mas das recomendações...

Desde cedo, foram-me apresentadas algumas, que naturalmente me desagradaram, por serem, a meu ver de criança, muito rígidas e de pouca valia.

Não entedia por que, todo ano, existia esta sexta-feira em que me proibiam de comer carne, senão a de peixe, subir em árvores, jogar pedra em lagartixas, com ou sem a intenção de feri-las, tomar banho de rio, bica ou chuveiro, falar palavrão de qualquer tamanho ou espécie.

Hoje, já idoso, continuo sem entender por que me impunham tamanho castigo. Ora, não haveria outro meio, menos doloroso, mais humano e progressista, de ensinar uma criança acerca de assuntos por ela desconhecidos? Por que teria a pobre criança, como se não bastasse ser criança pobre, de pagar jejum, sobretudo em uma sexta-feira?

A sensação era de impotência ante a imposição parental, social, catedrática.

Alguém tinha feito alguma travessura, e a pobre criança, criança pobre, era quem pagava o pato, sofria o castigo. Não importava se obtinha boas notas na escola, se solidário com o planeta, se alimentava as galinhas no horário previsto, se forrava cama a contento... Afinal, essas ações socialmente recomendáveis, por mais que a pobre criança, criança pobre, lhes desse conta, existia esta sexta-feira em que lhe proibiam de ser ou de querer ser.

Quem sabe, com o fim da batalha de Stalingrado, da Grande Depressão de 1929, após a Redemocratização e mais recentemente com o surgimento do PIX, a didática social-religiosa ensinada a nossas crianças tenha mudado um pouco, passando do campo eclesiástico para o econômico. Quem sabe?

Damião Caetano da Silva
Enviado por Damião Caetano da Silva em 07/04/2023
Reeditado em 07/04/2023
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