O CORAÇÃO DA PALAVRA
Tarde sonolenta de domingo, nada de muito atraente. Releio textos e poemas para novo livro. Sou um sórdido carrasco de meus textos. Nunca os considero prontos, especialmente os poemas, que são matéria viva em constante combustão estética, além de que têm de dizer algo de novo, com certa originalidade em conteúdo, signos e ritmo.
Em literatura, nada é mais difícil do que a composição de um poema, mesmo que a intuição nos solfeje ao ouvido até mesmo uma canção de ninar e suas ingenuidades. Porém, por estar vivo, toda a minha humilde obra está em permanente ebulição, mesmo que o tempo seja implacável para com os veteranos de mais de setenta.
Não acredito muito na tônica da inspiração, sou apenas um "operário em construção cármica", ação e efeito, semelhante aos venturosos exus de Vinicius de Moraes.
O povo das ruas sabe esparramar nos cruzeiros mais ermos flores, pinga, velas, pólvora e giz, até o sangue para que o inumano adote suas farsantes fantasias e/ou o condão misógino dos sonhos banhando signos lavrados pela inquietação urgente do ego e seus alter egos tementes aos pecados sexuais.
Como vês, amigo inominado, a palavra, em mim (ou no tal de alter ego, o bastardo sem nenhum compromisso escrito), por vezes é uma máquina de movimento contínuo.
Bem, engolir a emoção, o sensitivo que fala à toa, e, por vezes, escarcear o senso prático, é sinal de prudência. Enfim, cale-se a aflitiva psique que não necessitou de convite para se fazer presença.
No mais, restam os gonzos, sinetas e sinos para saudar a hora grande do poema sem rosto, aquele que cala o coração da palavra.
MONCKS, Joaquim. O CAOS MORDE A PALAVRA. Obra inédita em livro solo, 2023.
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