A PROCISSÃO DOS HOMENS
Meia-noite. O andor desce os degraus da igreja de Nossa Senhora da Conceição em Patos, Paraíba, e segue pelas ruas numa procissão inusitada. O Senhor morto é carregado nos ombros de concidadãos bucólicos para que jamais seja enterrado na incredulidade terrena. As matracas organizam a multidão de homens que se forma apressada como se surgisse de todas as esquinas do mundo.
Nas pedras mosaicadas que se estendem doravante, a comunhão com o altíssimo; cujo atrito dos pés no chão, emite um som de marcha para o céu. Aquelas pobres criaturas debulhando as contas do rosário vão cumprindo a sua própria penitência.
Às portas e janelas das casas, emolduradas, mulheres contemplam a passagem daqueles que suportam o tempo embrutecidos pela vida. E, só depois, voltam-se para dentro de si mesmas; mas não sem antes pedirem para que a alma de seus homens regresse menos atribulada.
O recebimento do corpo de Cristo se dá na Catedral de Nossa Senhora Daguia, como acontece tradicionalmente e não como uma liturgia da igreja. "Bem-aventurados os que aqui chegam nesta madrugada para a honra e glória do Senhor ". E um coro de mil vozes responde em uníssono ao cerimonialista: - Amém.
A procissão dos homens não acontece em nenhum outro lugar, a não ser dentro do coração de cada peregrino. É por isso um momento para se refletir sobre renúncias e sacrifícios; a iniciação dos filhos varões pelo caminho da retidão; o beijo à modelagem/imagem em absolvição aos erros e iniquidades... - Antes de se debandar de vez, porém cônscios de que aquele não foi um percurso ordinário de obediência aos costumes, mas de transformação espiritual e renovação da fé.