O GRANDE ERRO DO PAI DE TIAGO
Por mais devotados possam ser, pais às vezes cometem sérios erros, capazes de impactar seus filhos e ficar para sempre na memória.
Tiago deveria estar na faixa dos sete anos quando o pai, seu xará, se equivocou. Bem verdade que tal equívoco somente vem a ser descoberto pelo menino mais tarde, nem ele sabe precisar o momento exato. Ainda na infância? Na adolescência? Uma dúvida a mais no incomensurável rol da existência humana...
O relevante dessa história é que o erro jamais foi esquecido pelo jovem, que até hoje, adulto, ainda se diverte ao lembrar-se do fato.
Diverte-se? Sim, existem erros que vêm para mal enquanto outros provocam ampla satisfação.
A Justiça, essa instituição possivelmente campeã em propalados erros e acertos, constitui seguro exemplo. Quantas falhas em julgamentos não acarretaram punições injustas ao passo que outras, contrario sensu, beneficiaram réus nada inocentes?
Para não alongar o suspense, em que consistiu a mencionada falha do pai de Tiago, cidadão comumente organizado e zeloso de seus deveres de chefe de família?
Aproximava-se a Páscoa, época que só perdia para o Natal entre as expectativas comemorativas do filho, chocólatra desde cedo. Domingo era o dia tão aguardado para a chegada do célebre coelho, que distribuía ovos às crianças e desafios às mães para manterem saudáveis as dentições da meninada. Mesmo sem nunca haver avistado o magnânimo roedor, o garoto nele acreditava piamente, com a confiança de quem aposta na própria bondade para ser agraciado com muito chocolate.
Naquele domingo, qual não foi sua alegria ao encontrar a cesta (mal escondida), cheia de ovos, de tamanho pequeno, mas numerosos e de colorido variado, perfeitos para animar o festim gastronômico. Que prazer em manusear tantas iguarias que estimulavam o paladar antes mesmo de serem desembaladas e degustadas!
Nem tudo se festeja plenamente, entretanto. Na segunda-feira, antes de sair de casa para a escola, o pequeno Tiago surpreende-se com o pedido da mãe de não contar a seus colegas sobre a cesta de ovos. Apesar de tagarela por natureza estritamente pessoal (nada de hereditário, isentem-se os pais de culpa nesse particular), o menino conseguiu conter-se e ninguém soube das delícias dominicais que ele recebera, nem a querida professora.
No domingo seguinte, nova surpresa! O coelho voltou a agraciar o bem comportado garoto com mais chocolate, dessa feita na forma de um grande ovo embalado em papel dourado, para deixar igualmente brilhantes e cheios de cobiça pelo “ouro” os olhos do glutão.
Além de vibrar com a dose dupla e seguida de seu alimento favorito, Tiago, agora sim, recebe a autorização materna para jactar-se de sua felicidade pascoal ante os amigos na escola. Orientam-no, porém, a só falar do ovo gigante.
Pois é, há erros que resultam no bem. O pai de Tiago equivocara-se de domingo e antecipara a entrega dos ovos menores comprados para o filho. Não lhe restou alternativa do que adquirir o produto novamente a fim de fazer o devido agrado no domingo correto, o seguinte.
Com isso ganhou o idólatra de chocolate. Recebeu delícias em dobro sem sequer estranhar. Distraído e desligado como em toda sua infância (ou mesmo depois), o menino nem se perguntou como o coelho o presenteou duas vezes seguidas. Pôr em dúvida a existência do benfeitor, então, claro que não, isso jamais lhe passaria pela cabeça.
No ano seguinte, tomou conhecimento da inexistência do coelho, bem como a do Papai Noel. Mal se importou com tais revelações. Tampouco se deu conta, de imediato, do erro cometido por seu pai. Como dito antes, levou certo tempo para pensar no assunto e chegar a essa conclusão.
Soube perdoar, naturalmente. Quem dera a vida fosse toda assim, repleta de erros benéficos!
Abril 2023
F E L I Z PÁ S C O A!