O coração do escorpião
- Meninos e meninas, hoje o bicho vai pegar! E o prato do dia é...
- Fatal que é alguma coisa que tem no céu!
- Fechou, Fatal! Bora conhecer o Zodíaco!
- Vixi, é aquelas parada dos horóscopo, Professor?
- O meu é Aquário, tá ligado?
- Eita, dia 28 de novembro é qual signo mesmo?
- Paz no coração, galera! Todo mundo vai poder conferir o seu, tem a tabelinha das datas, mas já vou adiantando que geral vai ter uma surpresa meio que...
- Deselegante!
- É mais ou menos por aí, Perfume! Mas pra começar, pessoal, vâmo deixar uma coisa bem combinada: aqui a gente tá estudando Astronomia, que é bem diferente da Astrologia. Então é cada um no seu quadrado pra não ter confusão, mas em alguns momentos vai ser impossível não fazer comparações.
- Ih, aí tem coisa...
- Tem sim, Ariane! Tem ciência pra caramba!
- Então demorou, Professor!
- Também tem bastante história. Vamos cair pra dentro da mitologia das constelações zodiacais.
- Nem precisa ensinar, Professor! Todo mundo aqui assiste os Cavaleiros do Zodíaco.
- Duvido quem não sabe tudo de cor, pode perguntar qualquer um dos doze!
- E se eu te disser que são treze, Presidente?
- Pronto, já começou as groselha!
- Ah, Professor! Então já vai miguelar que tem um signo a mais?
- Lembra do que combinamos, dona Alícia? Tem que separar as ciências. E olha que tem muita gente que nem considera a Astrologia como ciência. E antes que alguém pergunte o que eu acho, aproveito pra responder: Não tem miguelagem nenhuma! Signo não sei se tem a mais, mas as constelações zodiacais tão lá desde sempre, são treze, reconhecidas pela União Astronômica há quase cem anos.
- Mas vamos do início. E onde é que começou muita coisa mesmo?
- Grécia!
- Pois é, tão sabendo mesmo! Do grego: zoo = animal + diaco = círculo. Então, temos no céu o círculo dos animais. Mas também tem objetos, pessoas e até gente da nobreza do Olimpo. São treze constelações alinhadas com a órbita da Terra, que por sinal, tem um nome pra lá de esquisito: eclíptica!
- Parou, parou! Traduz aí, Professor, que até agora só consegui entender o que tá em grego!
- Calma, Djow! Não desespera, tem figura pra ajudar a desembaçar. Olha aí a imagem.
- Temos o sol no centro e a Terra percorrendo seu caminho em torno dele, fazendo seu movimento de revolução, que a gente sempre aprendeu como translação, fechando uma volta a cada 365 dias e seis horas, ou seja, um ano.
- Eita, então cada ano é uma revolução?
- Isso mesmo! E a eclíptica é a projeção desse caminho. Para quem está aqui na Terra, a impressão é a de que o sol, a lua, os planetas e as constelações do zodíaco se movem nessa linha. Por isso se diz que a eclíptica é o movimento aparente do sol em nosso céu, porque, na real, é o nosso planeta que tá no corre.
- E vâmo pro que interessa: por causa desse movimento, a Terra fica alinhada por um período com cada uma das constelações zodiacais durante o ano. Em junho, temos o alinhamento da Terra e do sol com Touro, entre julho e agosto já está com Câncer. E é assim que se definem os tais dos signos, pelo alinhamento dos astros no dia do nascimento da gente.
- Opa, peraí! Eu nasci em 06 de junho. Eu sou de Gêmeos! Não sou de Touro!
- E eu sou de Leão, nasci no dia 29 de julho. Tá tudo errado isso aí!
- Pois é, meus queridos! Chegou a hora do choque! Olhem a tabelinha dos períodos de alinhamento com cada constelação. Praticamente todo mundo vai ter que se acostumar com a ideia de que, até agora, tava vinculado com o signo seguinte ao que realmente pertence.
Áries – 19 de abril a 13 de maio
Touro – 14 de maio a 21 de junho
Gêmeos – 22 de junho a 20 de julho
Câncer – 21 de julho a 10 de agosto
Leão – 11 de agosto a 16 de setembro
Virgem – 17 de setembro a 30 de outubro
Libra – 31 de outubro a 22 de novembro
Escorpião – 23 a 29 de novembro
Ofiúco – 30 de novembro a 17 de dezembro
Sagitário – 18 de dezembro a 19 de janeiro
Capricórnio – 20 de janeiro a 16 de fevereiro
Aquário – 17 de fevereiro a 11 de março
Peixes – 12 de março a 18 de abril
- Fala sério, Professor! Então, tipo assim, todo mundo tem que pular uma casa pra trás no horóscopo?
- Ah, eu não quero nem saber! Eu sou de Sagitário. Sempre fui, não vou mudar agora!
- Seus cabeça-dura! O Professor já falou que tem que separar Astrologia e Astronomia, tá ligado?
- É isso, Tá Ligado! Deixa eu mostrar pra vocês porque existe essa diferença nas datas que determinam os signos.
Então, o Educador tirou da gaveta um pião. Aquele mesmo, o brinquedo de lançar. Só tinha uma modificação: uma haste de madeira de uns dez centímetros encaixada na parte superior.
- Imaginem que esse pião é a Terra. Esse palito é o eixo de rotação do planeta. E esse movimento todo mundo conhece bem. É o que a Terra faz em torno de si mesma, dura 24 horas, ou seja, um dia. Então pensem na seguinte situação: a Terra girando sobre seu próprio eixo, representado pelo palito. Apesar de estar rodando, o eixo continua indicando uma linha reta, ok?
- Só que não! A gente sempre se acostumou a relacionar a gravidade com coisa caindo no chão, como se fosse uma força vertical. Mas precisamos ver a gravidade como o maior cabo-de-guerra do universo. E é todo mundo atraindo todo mundo, mas quem tem mais massa tem maior força pra atrair quem tem menos massa.
- E nós também tâmo no meio de uma disputa dessas. De um lado, a Terra tá sendo puxada pelo sol e, de outro, pela lua. É claro que a força de atração do sol é muito maior que a da lua, mas essa tensão toda acaba causando uma alteração mínima no movimento do nosso planeta. E o nosso eixo acaba saindo do centro.
E o Educador lançou o pião, mas esperou um pouco mais pra puxar a cordinha, pra que o brinquedo não girasse totalmente na vertical.
- Olhem isso, astrônomos! Estamos rodando, mas sofremos influência da gravidade do sol e da lua. Resultado: ficamos balançados no movimento. Agora foco no palito: não aponta para uma linha reta. Nosso eixo de rotação projeta um círculo.
- É mesmo! O palito tá dançando, Professor!
- Estamos dançando o tempo todo, meu caro! O nome disso é precessão dos equinócios, mas costuma ser chamado de movimento de precessão. Pra nós é imperceptível, porque pra fazer uma volta completa, o eixo leva cerca de 26 mil anos.
- Muito louco, mas o que tem a ver com os signo?
- Só tudo, Lasanha! Esse “jogo” do nosso planeta provoca uma mudança no alinhamento com as constelações e, mais ou menos a cada três mil anos, a gente “volta uma casa” no zodíaco. Acontece que a Astrologia simplesmente não considera esse movimento e não atualiza suas datas. Daí a diferença.
- Caramba! Deixa ver se entendi. Tipo assim, no dia do meu aniversário, 02 de abril, três mil anos atrás, a Terra e o sol tavam na reta de Áries, mas hoje, nesse mesmo dia, quem tá na reta é Peixes, por causa desse bamboleio aí...
- É isso, Ana Laís! Achou a melhor definição pro movimento de precessão: bamboleio!
- Mas então por que ninguém acerta logo essa tabela furada pra deixar as data aí batendo com o que tá rolando no céu?
- Sempre foi assim! Vocês vão ouvir muito isso na vida. E podem ter certeza de que, na grande maioria das vezes, será sobre algo que já se sabe há muito tempo que tá errado, mas por algum motivo – geralmente pra manter privilégios ou pra evitar que se perca aquilo que se ganhou indevidamente - ninguém faz nada pra corrigir.
- Um dia vocês conhecerão a Tabela de Isenção do Imposto de Renda: também tá defasada há uns três mil anos. Quem tem poder pra atualizar os valores, não tem vontade; quem tem vontade, não tem poder pra fazer. E vai ficando assim mesmo e todo mundo aceita...
- Então questionem sempre, procurem sempre confirmação pra tudo que falarem pra vocês. Inclusive pra o que eu também tô falando!
- Mas, Professor! Esse povo é tão teimoso assim pra querer contrariar até as posição das estrela?
- Vocês ainda não viram nada. Vou mandar só mais uma: não sei se notaram, mas o tempo que a Terra e o sol ficam alinhados com as constelações não é uniforme. Com Escorpião, o período é só de 23 a 29 de novembro. Apenas uma semana! Já com Virgem, o trânsito leva praticamente um mês e meio, de 17 de setembro a 30 de outubro.
- Então tem muito mais gente que nasce no alinhamento com Virgem do que com Escorpião?
- Exato, bela dedução! Já pela tabela do horóscopo, o ano é dividido em 12 períodos iguais, com os alinhamentos de cada constelação durando todos cerca de 30 dias.
- Sacanagem! Isso é o maior caô, tá ligado?
- Rapaz, vou até te dizer que nem foi por má-fé. É que lá no início, a Astrologia era usada pra garantir a sobrevivência: pelo movimento dos astros, era possível identificar as mudanças de estações, marcar os períodos de chuva e estiagem e outras previsões.
Então, pela posição do sol em relação a uma certa constelação, o pessoal sabia que já era tempo de plantio, de colheita, de se preparar pra dias mais frios, pra temporada dos ventos e por aí vai...
- Aí, pra “ajeitar” as constelações no período de um ano, tiveram a ideia de dividir o zodíaco em 12 partes iguais, com as datas de entrada e saída do sol praticamente iguais.
- Pura gambiarra!
- Solução técnica alternativa, vamos dizer.
- Tem aquela fita das treze constelação pra explicar, Professor! Qual ficou de fora?
- É Ofiúco, também conhecido como Esculápio ou Asclépio.
- Brother, castela os nome do maluco! Tá na cara porque ele foi tirado da lista!
- Na verdade, precisamos fazer justiça pra esse cidadão, galera! Tudo começou quando ele viu uma cobra morta sendo trazida de volta à vida por outra cobra, que tinha algumas ervas na boca pra ressuscitar a companheira.
- Ih, pronto! Começou a Mintologia!
- Fala sério, só pode ser lenda dos grego mesmo!
- Nosso amigo Ofiúco, bem ligeiro, começou a usar as ervas milagrosas pra curar as pessoas. Causou tanto, que já não tava morrendo quase ninguém. Mas acabou provocando a ira de Hades, irmão de Zeus, que comandava o mundo dos mortos.
- Vixi, mexeu com o dono do vapor!
- Até imagino o que rolou com o pajé lá dos grego!
- Segura o spoiler, Kerolyne! Então, Hades subiu pro Olimpo, foi reclamar com Zeus. Tava furioso porque já não chegava mais ninguém no reino dele, tava se sentindo desprestigiado, que aquilo era absurdo, que alguma providência tinha que ser tomada pra restabelecer as leis da natureza...
- E o que o Zeus fez?
- Não teve alternativa, lançou um raio em Ofiúco! Fulminou o cara! Mas resolveu dar um lugar de destaque pra ele no céu. E aproveitou pra dar uma provocadinha em Hades. Tretinha de irmão, sabe como é? Transformado em constelação, Ofiúco passou a ser considerado pai das ciências médicas. E o símbolo da Medicina...
- Eu sei, eu sei! Duas cobras enroladas num...
- Bastão!
- Ah, vá! Que é as cobra do Ofiúco!
- Também conhecido como Serpentário!
- Nooooossa!
- E as outras constelação, Professor? Também tem história?
- Só todas, mas vâmo deixar pra desenrolar amanhã. Hoje ainda preciso mostrar umas imagens pra vocês. Pra reforçar a ideia de que muita coisa tá longe de ser aquilo que parece. Por isso, é essencial sempre checar se o que tá sendo mostrado ou falado pra vocês bate com a realidade.
- Tipo o movimento aparente do sol e das estrela, né Professor?
- Perfeito, aprendeu mesmo, Berê! Só que agora vâmo tratar do tamanho real e aparente dos astros. E garanto que vocês vão entrar em parafuso de novo!
- Pra mim é tudo igual, tirando o sol e a lua que são os mais maior, as estrelinha são tudo pontinho brilhante mesmo...
- Só que não, Dom! É bem diferente. Bora lá ver como eles são na vera! Pra começar: a Terra, os planetas menores e algumas luas.
- Agora, todos os planetas do sistema solar: já dá pra ver que a Terra passa longe de ser o maior.
- Eita, olha Júpiter!
- Sabe essa mancha vermelha, próxima a Urano, o planeta verde? É uma tempestade com ventos de 400 km/h que tá rolando há pelo menos 350 anos. Só esse furacão já é maior que a Terra.
- Os planetas comparados ao sol!
- Que humilhação! É um monstro!
- Então segurem essas!
O sol e algumas estrelas bem maiores:
Sírius - o olho do Cão Maior;
Vega – a mais brilhante da constelação da Lira;
Spica – de Virgem;
Arcturus – do Boieiro;
Alnitak – uma das Três Marias, que formam o cinturão de Órion, o Caçador.
- Reparem que a Terra já saiu da escala e Júpiter tem o tamanho de um pixel.
E tem mais:
Aldebaran – do Touro;
Canopus – da constelação da Carina, o casco do famoso navio Argo, usado por Jasão na busca pelo velo de ouro;
Rigel – outra da constelação de Órion;
Gama Cruxis, a mais alta do Cruzeiro do Sul.
Vejam que o diâmetro de Gama Cruxis é quase igual ao diâmetro da órbita do planeta Vênus! E agora é o sol que ficou reduzido a um pixel na escala.
- Mas por que a gente só vê os pontinhos brilhando?
- Na verdade, a gente só vê a luz que as estrelas emitem. Elas tão muito longe. A distância é tamanha que é impossível ver uma estrela a olho nu. A única que conseguimos ver mesmo é o sol. Ainda sim com um atraso de 8 minutos e 33 segundos.
Hora de falar de gente grande:
Deneb - da constelação do Cisne;
Mira – da constelação de Cetus, monstro marinho também identificado como a Baleia;
Betelgeuse - a maior de Órion;
Antares – o coração do Escorpião;
Mu Cephei – da constelação das Cefeidas.
Apesar de não ser a maior, quero chamar a atenção de vocês pra Antares. Aqui temos uma super gigante vermelha. Pra se ter uma ideia do tamanho da criança, se fosse possível colocar essa estrela no lugar do sol, o diâmetro dela ultrapassaria a órbita de Marte!
E o curioso é que seu nome significa Rival de Marte (Anti = contra + Ares = Marte), devido à coloração.
- Sem chance pra Marte, ela é maior infinito ao cubo!
- Mais um caso em que a distância esconde a diferença, pois a luz de Antares, viajando a 300 mil quilômetros por segundo, demora mais ou menos 600 anos pra chegar até aqui.
- Longe pra...
- Por isso é que parece só um mais pontinho como qualquer outro...
- Caraca, mano! Mas é o maior coração das galáxia, tá ligado?
- Que inveja do Escorpião!
- Já pensou se cada um tivesse um coração tão grande e tão brilhante? Acho que todo mundo seria bem mais feliz!
O Educador já tava começando a pensar em chorar, mas a invertida veio na velocidade da luz.
- Se liga, ô sonhadora! Olha pra nois! Nem um pixel perto desses mamute aí...
- Pior, não tâmo nem na foto mesmo!
- Lindões e lindinhas, prestem atenção! Somos pequenos, mas não somos nada! Muito pelo contrário, somos tudo!
- Pirou, Professor? Como assim somos tudo?
- É, e você mesmo que acabou de falar que é pra gente duvidar, questionar e tals...
- Puxa vida, sinuca de bico agora, hein? Pra sair dessa, vou recorrer a um grande sábio, exímio conhecedor do cosmos: um tal de Raulzito! Na música “Meu amigo Pedro”, bem no finalzinho, ele diz:
Cada um de nós é um universo, Pedro!
É que tudo acaba onde começou...