DOCE DE VOVÔ COM GELEIA DE VOVÓ

 

     Netos sabem, não há nada melhor do que um doce de vovô com geleia de vovó. É que os vovôs são um pouco mais duros, só um pouco, e as vovós são derretidas pelos netos.

     Tenho um sentimento de culpa enorme por meus filhos. Dei-lhes palmadas fortes, peguei-os pouco no colo, beijei-os menos ainda, contei-lhes poucas histórias e passeamos quase nada.

     Vínhamos a Campo Grande, a capital do meu Estado, Mato Grosso do Sul, e meus filhos tinham seis, oito anos, não sei. Por aí. Na Avenida Afonso Pena, perto da Rodoviária Velha, existia um parque permanente, com roda-gigante, trenzinhos, tiro ao alvo, maçãs-do-amor, pipocas, muitas luzes, muitas mesmo.

     Ao nos aproximarmos começava a gritaria:

     - Pai, vamos ao parque. Para o carro.

     - Eu quero ir na roda-gigante.

     - Eu quero pipoca.

     E sempre vinha a minha resposta dura e fria, sem nenhum sentimento de vovô doce:

     - Amanhã a gente vem!

     Amanhã, porque depois de hoje vem amanhã e depois de amanhã vem outro amanhã e por aí vai.

     Eles cresceram e não foram ao parque, por isso eu morro por dentro só quando lembro dessa falta imperdoável, do bem que me faria ter levado os dois ali, ver seus rostinhos felizes encantados, ver os olhinhos de jabuticaba da Taísa brilhando e os cabelinhos loiros do Lucas esvoaçados na roda-gigante.

     Foi-se o tempo, hoje sou avô.

     Avô, caríssimo leitor, é doce. Leio os sentimentos de uma criança de longe. Sonho por elas e com elas, brinco e fantasio, invento histórias, dou muitas risadas de suas traquinagens.

     Outro dia a Carolina estava em casa e resolveu disciplinar o Leo, que não saía do banheiro. Era um banho interminável, cantando, gritando e jogando água para todo lado.

     Eu de cá ouvindo ela dar uma dura no menino, meu netão.

     Nem sei como, levantei e fui até o local da rinha.

     - Leo, obedece sua mãe. Carolina deixa ele aí que já vai terminar.

     Carolina ficou brava comigo e saiu bufando para o quarto. O Leo me olhando envergonhado. Saí de perto.

     Custava deixar o guri jogar água no banheiro, dar risada, se divertir bastante até porque, um dia, ele irá se despedir dos seus seis anos e, depois dos dez, deixar de ser menino com essa alegria incontida?

     Pois é, amigos. É verdade.

     Carolina, desculpa o tio.

     Avô é doce, acho até que faz mal.