Etarismo
Patrícia Linares, estudante de biomedicina na Unisagrado (bauru), foi ridicularizada nas redes sociais pelas colegas de curso pelo fato de ter quarenta e quatro anos e estar iniciando um curso de graduação. A imprensa comentou o caso, as colegas se retrataram. Agora, dizem que Patrícia foi bem recebida na faculdade com flores e chocolates das outras colegas.
Vendo o destaque deste caso, lembrei da experiência que tive ao voltar para uma sala de aula aos cinquenta e cinco anos no curso de graduação de filosofia na Faculdade de Ciências Humanas da UFMG.
Fiz carreira e paguei minha vida com a profissão de odontóloga. O desejo de estudar filosofia me acompanhou pela vida. Esta vontade aumentou mais ainda quando comecei a ler sozinha tratados filosóficos e não conseguia entender a maior parte deles. Resolvi então, aos cinquenta e quatro anos, estudar e fazer o ENEM. Passei!
No primeiro dia de aula da minha graduação em filosofia, entrei na sala com apreensão pensando na loucura de me envolver em uma sala de aula junto com jovens de dezessete anos. Eles vão estranhar. Não conseguirei me enturmar. Eu me sentia inapropriada para estar neste ambiente. Sabe aquela coisa do já deu? Você não vai conseguir estudar e nem conviver com estas pessoas. Todo mundo vai estranhar. Entrei de cabeça baixa, sentei bem isolada e torci para que ninguém falasse comigo. Eu me sentia um alienígena velho naquele ambiente.
Este sentimento era meu, eu que me fazia diferente. A minha experiência? Ninguém perguntou a minha idade e nem me tratou diferente. Em cinco anos que estive lá nunca foi feito, por ninguém, alusão à minha idade. Eu era um deles. Não havia esta questão de ser mais velha. Eu era convidada para as festas e reuniões da turma. Fazíamos trabalhos juntos, passávamos os intervalos das aulas conversando, trocávamos textos e livros, compartilhávamos experiências de aprendizado e de vida. Fiz amigos que tenho até hoje, alguns jovens, mais novos que os meus filhos.
Cada um tem sua experiência e história de vida. Cada um reage de um modo às coisas boas e ruins. Não estou querendo justificar a agressão. Neste mundo em que todos falam de preconceito e todos reivindicam igualdade, é sintomático que se tenha tanta agressão, tanto desentendimento. Sou a favor de mais atitudes que discursos. Às vezes acolhemos o outro com o silêncio, um olhar. Em um mundo que todos se respeitassem não haveria o porque lutar contra preconceitos. Utopia? Ingenuidade? Redução do problema? Quem sabe? Soluções? Teriam que ser de todos nós.
Márcia Cris Almeida
16/03/2023
Dedico este texto à turma de filosofia da FAFICH / UFMG/2012