MINHA JANELA E A CHUVA

O dia hoje já nasceu inspirador, parece até que está surgindo pela primeira vez em minha vida, não porque neste momento estou muito feliz ou porque aconteceu algo em minha vida que me faz ver as coisas “cor de rosa”, como dizem na linguagem popular. Acontece que se trata de um dia especial, pois o céu está cinza (não por poluição), mas por uma razão natural que conhecemos bem, ou seja, trata-se de um dia nublado, onde as nuvens parecem andar aceleradas uma ao lado da outra, desenhando várias formas de expressão, sendo que algumas delas um pouco separadas dão ensejo à entrada de luzes solar, tornando-se brilhantes e mudando um pouco as cores do cenário, como se fossem luzes numa noite escura irradiando beleza, mas logo vejo que é só um ensaio sazonal e passageiro, pois as nuvens estão dispostas a se tornarem as imperadoras do céu, não deixando que outros fatores naturais intervenham em suas manobras para anunciarem chuva, ou ao menos manterem um padrão constante de ameaças para quem passa embaixo se arriscando receber alguns pingos de felicidade.

Logo vejo que não é um dia tão especial assim, porque algumas pessoas estão correndo e se arriscando a andar mais rápido nas avenidas para poderem chegar em seus abrigos antes das primeiras gotas de chuva. Talvez, como o horário é impróprio para uma chuva, pois se trata de um horário de pico, quando as pessoas se dirigem para o trabalho, as nuvens se seguram lá em cima para poder derramar suas lágrimas algumas horas depois, para não molhar esses trabalhadores que circulam à pé, de bicicleta, de ônibus, pois sabe que para alguns outros a sua fúria não atingirá, pois circulam no próprio automóvel particular.

Chegando ao meu abrigo diário, onde concretizo meu trabalho numa assessoria jurídica ligada ao Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, percebo que a natureza continua a me acompanhar quando abro minha janela e vejo um cenário verde, estonteante, brilhante, aconchegante, vivo e radiante, as árvores balançam seus galhos, as folhas se agitam com o vento, a relva ainda latente pela ausência do sol, cobre a grama abundante com seu véu incolor impregnado de suas gotículas minúsculas que ante a grandeza de sua presença, lembram as águas cristalinas de um rio formando um espelho refletor de uma imagem inigualável que penetra no fundo da alma, fazendo-me respirar fundo e suspirar compassadamente, pois ainda me encontro sozinho e não temo as possíveis perguntas que poderiam ser ocasionadas pela minha maneira pouco comum de expressar meu sentimento.

Mas o anunciado passa a ecoar sublime do lado de fora. Da minha janela vejo aquelas gotículas enormes de água que descem abundante dos céus, como se quisesse expressar que a chuva pôde segurar-se o quanto foi possível para deixar os trabalhadores chegar a um abrigo qualquer. Não poderia mais deixar de alvorar-se pelo imenso poderio pluviométrico e assim derramou sem trégua suas águas que imediatamente encharcaram a terra fértil dos jardins e da pequena mata preservada que é vista há alguns metros de minha janela. As árvores se abriam num frenético vai-e-vem como se quisessem aproveitar ao máximo aquelas águas, para que se alojassem no seu caule e nas suas raízes para poderem desfrutá-las nos momentos de calor e de secas que poderiam porvir num futuro mais pessimista.

Os relâmpagos e os raios caiam nas extremidades das alamedas que nesse instante estavam inundadas pelas enxurradas que marchavam rumo ao seu destino final, viajando pelas ruas e avenidas até encontrarem os riachos que dariam trânsito natural para suas investidas. Esse barulho incontido e intrépido de uma chuva torrencial invadia meus ouvidos e fazia-me lembrar de como é bom ouvir esse som das águas caindo, como se fossem uma cascata que caia ao sabor do vento e a respingar no nosso cérebro fazendo renascer o sabor da vida.

Mas o furor em certo momento deixou-se envolver por uma calmaria, quando as nuvens viram-se contidas de seu enorme peso pluviométrico e cederam ao momento de inversão da fúria, para arrematar sobre a terra seu último gotejar que remanesceu caindo de forma taciturna e serena, mas ainda não deixando de anunciar que poderia armar-se de poucas horas e repetir toda a faceta. Assim, as nuvens continuavam sisudas e ameaçadoras, como se quisessem dizer que não esperassem a contenção de sua fúria, porque continuariam alerta e vivas como sentinela da vontade do Criador.

Assim, um novo encanto se viu de minha janela, pois os seres vivos recomeçaram a dinâmica da vida, os pássaros mexendo-se nos galhos chacoalhavam suas plumagens expulsando as gotículas que ainda insistiam em permanecer sobre seu corpo. Logo voavam em direção ao chão em busca das traças ou possíveis insetos que molhados não tinham mais a destreza de antes para escapar dos predadores. As pessoas saíam apressadas, olhando para o céu como quisessem pedir mais um tempo para poder alcançar um outro abrigo. O vente forte aproveitava o momento para remexer em tudo que lhe fosse possível, levantando os galhos das árvores, mudando a trajetória dos vôos dos passarinhos, arremessando os guarda-chuvas para o mesmo sentido de sua investida.

Mas como num passe de mágica, talvez atendendo ordem do Criador, a natureza volveu sua metamorfose natural, logo todas as nuvens desapareceram e o Rei Sol se instalou naquele exterior, como se quisesse dar mais brilho ao meu cenário ótico, fazendo resplandecer uma nova imagem, desta feita colorida e refletiva anunciando que o dia continuaria normal como sempre foi e assim encerrou-se o meu encanto.

Machadinho
Enviado por Machadinho em 11/12/2007
Reeditado em 12/12/2007
Código do texto: T773392