Patropi

Gente chata. Eu tinha escrito um texto inteiro, longas linhas, parágrafos enormes, falando mal daquele querido que escuta música alta no ônibus, da barraquinha que te cobra só por respirar as moléculas de oxigênio da praia, de quem pega comida do prato do zoto, criança chorando no cinema, cardápio QR code, vape, o ranger do garfo no fundo do prato, síndrome do pequeno poder, de vira lata, chá de revelação sem a presença do grupo musical revelação, filmes do Adam Sandler que envelheceram mal, o Adam Sandler velho...

Mas aí

Aí uma duvidinha me corroeu o juízo. Será que EU quem sou o chato? E isso é daquelas coisas que quando se tem dúvida, é porque a resposta é sim.

Enfim, não importa a resposta, já apaguei mesmo.

Vamos falar então sobre brasileiro. Não que eu ache que tenha envergadura que dê conta de emoldurar e dissecar o espécime, mas é que tava pensando.

O que faz um brasileiro?

Ano de brasileiro só vem mesmo em fevereiro?

Pergunto essas coisas, porque li essa aspa aqui

E agora esse é o momento em que eu traio a crônica e o exercício da bobajada sem embasamento, mas vamo lá:

* “Cada cultura ordenou a seu modo o mundo que a circunscreve, esta ordenação dá um sentido cultural à aparente confusão das coisas naturais” (LARAIA, 2007:92).

E fiquei apertando os botões. O Brasil consegue por do avesso o sentido da própria cultura e ainda estar certo.

A autora segue dizendo que, sem essas coisas: “o comportamento do homem seria virtualmente ingovernável, um simples caos de atos sem sentido e de explosões emocionais, e sua experiência não teria praticamente qualquer forma” (GEERTZ, 2008:32-33).

Pô, se o carnaval não é um simples caos de atos sem sentido, explosões emocionais, e experiências disformes, eu não sei o que é. O que eu sei é que brasileiro se acende no carnaval, e eu me incluo nisso, tá? Eu adoro.

Mas não antes de rulminar se vale a pena sair de casa, de pensar, ou de deixar a mensagem a ser respondida e confirmada por uma meia horrinha... Tá isso não é do brasileiro, é de mim mesmo. Mas não é por mal, e que eu tô pensando. Aliás, eu penso demais. E nesse momento, agorinha que escrevo, minha cabeça tá sussurrando:

"vai lá inteligentão, que frase é essa, 'eu penso demais'... Se acha esse aí"

E assim vai. Eu sou o meu maior hater. Em matéria de auto-odiamento, tenho melhor argumento.

Mas voltando pro brasileiro. Fomos pra praia e tal, bebi pouco, porque, né. Não há quem aguente dois dias seguidos de álcool, um já tá bom. O engraçado

foi que... não, engraçado não, (Tenho que usar as palavras direito.) o absurdo foi que na hora de ir embora, tirar o carro do estacionamento, meu sobrinho na cadeirinha, meu cunhado manobrando o carro, minha irmã chegando do banheiro, me vem o camarada falando:

"cadê o papel?"

E a inflexão de voz não foi das melhores kk, não foi.

E nisso minha cabeça eriçou, ligou o "vai dar merda" O papel que o cara falava era o que comprovava se você pagou o estacionamento mesmo ou não.

Eu acho que consegui ver as palavras saindo da boca do cara, entrando na cabeça do meu cunhado numa fraçãozinha de segundos, pra ele dizer:

"não sei de (palavrão) de papel não"

E aí meus amigos, vou abrir um parêntese aqui, deixando de lado um pouco o perigo da situação, eu acho maravilhoso a capacidade das coisas de fugirem do controle. Deixo no ar se eu tô vivo mesmo, ou a coisa findou findando e escrevo essas palavras dum lugar entre uma coisa e outra.

Mas o interessante nisso tudo, e aí que entra a coisa do brasileiro, é que no meio da confusão toda alguns metros a frente, tinha um camarada vendendo algodão-doce, ignorando a pulsão de morte alheia na maior tranquilidade, num desimportamento da confusão que me deixou fascinado.

E é por isso que eu amo o Brasil.

Seja ele na forma dos estabelecimentos com cardápio QR code, naquele personagem da escolinha do professor, no vendedor de meio de confusão, ou no que ouve música alta no ônibus sem fone de ouvido.

*Citações retiradas do texto:

PARA ENTENDER O PATROPI

Um estudo sobre a atual imagem turística brasileira