O CÉU E O INFERNO
Francisco de Paula Melo Aguiar
Decorridos oitenta e cinco anos do assassinato de Lampião, ocorrido em 1938, a literatura de cordel faz ressuscitar o herói do povo louvado e decantado como tema e ou tese da Imperatriz Leopoldinense, campeã do carnaval carioca.
E o capitão do cangaço voltou a tona com força e brio de vencedor sendo aceito no céu e no inferno.
Deus nos acuda meu "Padim Ciço" do Juazeiro, principal "santo" protetor do rei do cangaço, segundo a historiografia brasileira relacionada ao tema, advindo da Velha República no período de 1890 a 1930.
E o Estado Novo Brasileiro patrocinou assim o extermínio da falange mais importante do cangaço nordestino até então.
Se bem que o Lampião cantado em verso e prosa, segundo a Literatura de Cordel é outro.
E a alma do cangaceiro agora entra nos céus do Pai Nosso, ensinado por Jesus Cristo, sic, no inferno de suas atitudes em defesa dos oprimidos e sem nada, como se fosse por analogia ao que determina a "Rerum Novarum", encíclica de Leão XIII, que a terra é de Deus e a propriedade é de ninguém (que abordava as questões mais delicadas do relacionamento entre empregado e patrão, como o salário justo, o limite da jornada de trabalho, o trabalho insalubre, o trabalho da mulher e o da criança, assim como o trabalho escravo), os mesmos ideais que alimentara o beato Antônio Conselheiro, o chefe de Canudos, precursor da reforma agrária nacional, igualmente exterminado na última década do século XIX pelo neófito Estado Republicano Brasileiro, o cenário era outro, logo no seu nascedouro, ex -vi o que conta Euclides da Cunha em "Os Sertões".
A banca examinadora do carnaval carioca entendeu o contrário em que exaltar o Capitão Lampião é lavar a alma nacional, dos sofridos, esquecidos e invisíveis, diante das contradições históricas de ontem, de hoje e não será diferente no amanhã.
E o povo simples aceita tudo calado (até pouco tempo, em parte), sem abrir a boca, seja lá como for para ele se ver representado na avenida, ter voz nos tribunais, nos palácios na paz e na guerra, inclusive no cangaço.
A tese defendida no maior espetáculo da Terra que o carnaval carioca representa para o mundo, faz honrar o sangue de Lampião e seus cabras da peste que tombaram e não se entregaram no dizer do imaginário popular nacional.
O povo brasileiro absolve e santifica o seu herói mais parecido consigo mesmo na sua visão de mundo.