Robustez de alma
Folheando e relendo em mais um verão as páginas do best-seller O Diário de Anne Frank (durante as férias sempre procuro ressignificar e me encontrar de um modo demasiado especial com o hábito da leitura), desacelerei o pensamento no transcorrer da fluidez enquanto lia e me atentei para uma máxima enunciada pela memorável Anne. Nesse cenário, muito me chamou atenção quando ela resolve confidenciar para o seu querido diário que o homem é grande de espírito, mas mesquinho nas ações. Em um primeiro momento, achei em síntese a frase para lá de bonita, sensacional em sua construção e eivada de senso crítico, tendo em vista que nenhum de nós que conhecemos a obra podemos negar que Anne Frank contando apenas entre treze e catorze anos de idade era à frente do seu tempo e possuía uma mente eloquente como quem tinha potencial para ser uma escritora conhecida em vários cantinhos dos arredores deste mundo. E ela se tornou, ainda que não da maneira pretendida, mas foi. Recaptulando, preliminarmente pareceu-me que valia a pena comprar tal ideia, mas a racionalizando imediatamente discordei. Oh, dó! Mas o incrível é que mesmo discordando, a supra invadiu meus neurônios e me gerou novas ideias, apontando para o caminho de reflexões que só um leitor paciente tem o deleite de saborear. A conclusão do meu pensar designou que a qualidade das ações de um homem sempre será equânime ao tamanho do espírito em uma adequação de proporcionalidade. Ora, seria para lá de contraditório acreditar que alguém apoderado de grandeza de alma e espírito é capaz de praticar ações mesquinhas, isto é, costuradas de pequenez e migalhas, não é mesmo?! Nós exteriorizamos para o mundo aquilo que somos. Em analogia, adentrando na esfera factícia do Direito Penal que tem por objeto o fato, percebemos que um fato delituoso perpassa o "iter criminis", a saber o caminho do crime e que dentro dele antes do agente dar início aos atos executórios, antes de tudo ele traça a fase da cogitação, que é o primeiro de todos os atos, fase interna e mental, quando aquilo que é praticado existe apenas no pensamento e ainda não foi colocado para fora. Em resumo, nessa seara toda conduta punível antes de ser perpetrada é desenhada na mente maliciosa de quem é desprovido de boas intenções. Seguindo adiante, na vida social em sua generalidade a equação e o resultado são os mesmos, em face de que todo mundo faz o que pensa e tem ações do mesmo tamanho que o espírito. Gente mesquinha nas ações não repousa a alma e espírito no inteligível e é rasa. Já dizia também o imaculado Senhor Jesus Cristo, narrando uma de suas parábolas em sua passagem que o que contamina o homem não é o que entra pela boca, que é o alimento físico, que degrada no máximo a carne, a matéria, mas o que sai pela boca, isso sim contamina o homem. Porque tudo o que sai pela boca procede do coração. O que a gente fala, faz, tudo é reflexo do que a gente pensa e das ideias que alimentamos. A boca fala daquilo que o coração está cheio! Que nesta manhã venhamos liberar a nossa melhor versão e expandir o nosso espírito. Outrossim, não vou deixar de salutar o quanto a Anne era grande demais de espírito e não o diminuiu em nada, posto ser de muita nobreza ousar ainda conseguir ver o homem como alguém grande de espírito no exato momento em que homens perversos da sua época estendiam leis e decretos ditatoriais, segregacionistas e transgressores de direitos humanos contra o seu povo pelo simples fato de ser quem era.