Forjada fundição

Contrastava com as casinhas apinhadas que o rodeiam aquele espaçoso galpão vazio, fundição que foi, sem nunca ter fundido. Era o sonho de gente empreendedora da pacata Velha Serrana embarcar no `boom` siderúrgico que tomou conta das Gerais nos anos cinquenta.

Toda cidade vizinha que se prezasse ia criando seu parque, com a ajuda de políticos, a abundància do minério - e o rór de carvoarias que se iam espalhando pelo Estado. Itaúna já ganhara certa reputação no fabrico de apetrechos de ferro gusa, como caixas de descarga, tampas de bueiros; Divinópolis, então, já andava rodeada de usinas fumacentas e até entrara no mundo mais especializado da aciaria; o Pará, cidade bem mais nova e mais rival, cada chaminé que levantava era mais um quinau que nos passava...

Era hora da reação. Colocávamo-nos afinal entre os primeiros municípios mineiros por ordem de fundação - e nada de fundição? O parque industrial da cidade era pífio, tirante a fábrica de tecidos e uma meia dúzia de fabriquetas que ia dos estanhados aos calçados, com o desdouro então de passar pela das vassouras de piaçava, de velas e de sabão!

Esforços, ao que consta e se conta, foram envidados - e malogrados. Razão? Deve ter havido delas um caminhão, que iria, e ria, da falta de força política, passando pelo passar da hora, à má localização do burgo, espremido entre montanhas, falto de boas estradas e as imorredouras rivalidades municipais, ainda mais íngremes. E de fundição, sobrou, vistoso, ocioso, o galpão.

Mas quem muito se riu e se livrou das inconveniências poluidoras da fundição, foi uma senhora, já velhinha, de lá vizinha, de enrugadinha, boa de prosa, que Tia Isabel tinha lembrança carinhosa, porém que achava tudo uma lorota: Dona Xoxota.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 15/02/2023
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