Uma matéria de jornal escrita na direiteza dos fatos.
Duas semanas sem escrever. Eu estaria mentindo se dissesse que foi porque nada acontece. Acho um descaso com a vida, injusto. Tanto esforço pra existir, reunir as condições ideais de temperatura e pressão, pra se localizar nem tão perto nem tão longe do sol, reunir os aminoácidos e sei lá mais o que da aula de biologia que não lembro, pra então vir um num sei quem e dizer que nada acontece, Não. A vida acontece lá, eu acho. Tenho é que dar passinhos de pleonasmo, sair pra fora. Se defenestrar. Legal essa palavra, né? Defenestrar. Aprendi hoje. É uma palavra específica pra designar quando se arremessa alguém de uma janela.
Eu poderia mentir, ia entreter. Acho que não, não. Tudo já é tão de plástico...e outra, eu levo isso aqui a sério, tá? Mentir usando as palavras só se for pro bem da frase, tipo poesia, pra escrever chamada jornalística, ou pro bem dos dentes. Tipo falar que tá indo, quando ainda nem se trocou, ou que claro que lembro do nosso aniversário de namoro, como ia esquecer uma data importante dessa, meu amor. E assim vai...
Isso é um negócio curioso sobre as coisas, sobre como a gente se cerca de protocolos. Por exemplo, Na pré história, ninguém ficava puto se você apagasse a mensagem pra dizer em seguida "nera nada não, pô". Ou então nas grandes navegações você não viajava por meses, navio, caminhos tortuosos, risco de passar dessa pra pior, querendo, sei lá, mandar uma mensagem a quem tivesse do outro lado, pro camarada visualizar, dar o checkzinho azul, e ponto. Não tinha isso.
É por isso que eu gosto de gente, o drama se renova a cada dia, cada ano, cada década. Esses dias achei engraçado, amiga minha falou que eu era dramático, disse que era elogio. Acho que é sim tem que ser, drama é bom, sem drama a vida seria só uma conversa chata as 0:47, sobre economia do canal livre. Ou então...ou então uma matéria de jornal escrita na direiteza dos fatos.
Por exemplo:
"Homem morre após cair de uma sacada" com todo respeito ao suicida hipotético, mas... CHATO.
"Coração defenestrado: Homem se atira de janela após traição"
VIU SÓ, Viu só o simbolismo, a tensão, A MISE EN SCENE?
Você imagina, fica pensandinho. Como será que foi a traição? Estavam juntos faz tempo? Foi com alguém conhecido? Porque alguém se jogaria de uma sacada assim, por outra pessoa? Foi de um prédio alto de morrer na hora, ou ele ainda ficou por ali um tempo?
Nunca saberemos. Mas é isso que eu penso, é isso que eu faço enquanto o carnaval acontece, penso sobre corações arremessados de janelas, ou naquele desenho de coluna vertebral que a blusa aberta nas costas deixou,
mas isso é conversa pra outra crônica.
Até mais.
(Aah, e por favor, não se atirem de janelas)