Chovia
Já estava pronto para sair.
Abri a porta da sala e vi que a chuva estava pior do que parecia. Com a casa toda fechada, eu estava me baseando só no barulho.
Fui até a janela que ficava do outro lado, pois de lá dava para ver o ponto de ônibus. Estava tudo branco de tanta chuva que caía e ventava muito, o guarda-chuva não iria dar conta. Fiquei quase meia hora olhando e não passou nenhum ônibus.
Resolvi tirar os sapatos, deixar os pés respirando e à vontade. Meu Deus! Como esses sapatos apertam! Assim que a chuva estiar, calço eles novamente e saio.
Olhei pela janela por mais 10 minutos. Nada. Abri a porta novamente. As poças no chão estavam enormes e as enxurradas pareciam as Cataratas do Iguaçu.
Tirei o paletó e pendurei no cabideiro ao lado da porta. Afrouxei a gravata. Respirar, sim respirar.
Liguei o ventilador, sentei no sofá e pus os pés no pufe.
Comecei a pensar se realmente valia a pena ir àquela festa. Eu nem conhecia as pessoas direito.
Lembrei da minha infância, quando minha mãe me levava às festas das suas amigas, nas quais só havia gente mais velha e nenhuma diversão para uma criança. Na maioria das vezes eu saía andando pelas casas à procura de alguma coisa divertida, mas, vira e mexe, quebrava um item decorativo: um vaso, uma xícara ou algo no estilo.
Às vezes íamos a festas de primos que eu nem conhecia. Na maioria das vezes não dava tempo nem de me enturmar. Ficava meio sem jeito de me aproximar e só observava, de longe, os presentes sendo abertos e como brincavam com eles. Alguns salgadinhos, o parabéns, o bolo, os docinhos e já estávamos voltando para casa.
Neste momento, dei uma olhada no relógio e mais meia hora havia se passado. Olhei novamente pela janela e deu para ver a silhueta de um ônibus passando.
Acabei de tirar a gravata, desabotoei a camisa, arregacei as mangas e tirei as meias.
Fui à cozinha tomar um copo d’água. Na mesa havia um último pedaço restante de um bolo que eu estava comendo há dias no café da manhã, dei a primeira mordida e me lembrei do Toddynho do meu sobrinho, que estava na geladeira. Resolvi tomar, depois era só comprar outro, ele só viria aqui em casa de novo na semana seguinte.
Desta vez o saudosismo veio de forma mais agradável. Lembranças boas foram voltando à minha memória. Lembrei de um videogame que estava guardado desde o final dos anos 90, fui buscá-lo no meio dos meus cacarecos.
Voltei para a sala.
Anos atrás, as garrinhas eram conectadas à entrada da antena da TV, mas agora precisavam de um adaptador. Eu tinha. Conectei tudo, liguei o videogame na tomada e apertei o botão “Power”. Ele funcionou direitinho, exatamente do mesmo jeito que funcionava antes.
Achei na caixa o cartucho do jogo que eu mais gostava de jogar na minha adolescência, soprei embaixo e inseri. A manete boa era a que tinha uma marca feita com corretivo. Peguei ela e virei a madrugada jogando, só de samba-canção.
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