LONELY BEE/BLACK BUTTERFLY
Em dezembro de 2018 participei de uma vivência sobre abelhas solitárias, conduzida por um jovem biólogo. Até aquele dia, não tinha ideia de que abelhas pudessem ser solitárias. No mundo animal, assim como as formigas, elas são vistas como símbolo de trabalho, organização, cooperação, menos de solidão. Não enquanto se pensa a solidão como a ausência de outros. Até aquele dia, desconfiava que é bem possível estar só, mesmo em meio à multidão, assim como a solitude não é o mesmo que não ter ninguém. Foi a solidão que me levou até as abelhas. A ideia (de que pudessem ser solitárias) criou um paradoxo entre o que pensava saber e o que desejava encontrar. Obriguei-me a conhecê-las, muito embora entre elas parecesse mais uma vespa ou uma mosca atordoada. Tinha lá meus dias de larva, quando o mundo parecia um casulo interminável em que me espremia e contorcia, à espera do descolar das asas. Comecei a pesquisar insetos. A palavra me remetia a criaturinhas feias, arredias ou incomodas, em busca de uma distração do mundo que lhes permitisse existir. As lembranças mais fortes eram de asco, medo e despreparo em lidar com seres tão pequenos, tão aparentemente desprezíveis, no máximo inúteis, sem razão muitas vezes. Exceto as borboletas, estes seres de vida breve tinham direito a um olhar mais comovido: a beleza e a leveza, apesar de efêmeras, eram passaporte para transitar pelo mundo. Não chegam a incomodar, nem ferrão elas têm, morrem às vezes espetadas num quadro de colecionador.
Em duas ocasiões, durante a infância, representei insetos: uma abelha de vestido listrado, asas de arame e papel celofane e a borboleta. Não uma das coloridas, uma borboleta preta. Não lembro ao certo do que se tratava, algo parecido como o direito ao amor de Deus, não importa o quão pequeno ou feio cada um de nós possa parecer. Cinco ou seis anos e a roupa preta, as asas de arame e celofane escuro lembravam uma bruxa e eu gostava. As bruxas sempre exerceram fascínio sobre mim, já que uma fada certamente não era. Cedo aprendi o poder das palavras. Falava sozinha e escrevia. Nos cadernos, em guardanapos de papel, nos muros, nas calçadas, nos panos de bordar, na areia. Recitava sortilégios, feitiços tecidos de esperança e desejo. Um dia teria asas, aprenderia a voar e seria bela. Apresentada à solidão das abelhas, entendi que alguns de nós, abelhas ou borboletas, coloridas ou não, seremos sempre solitários, mesmo vivendo (ou especialmente vivendo) em colmeias superpovoadas. E talvez, tudo que nos caiba seja fortalecer e admirar, enquanto possível, nossas asas imensas. Porque, para além da solidão, sempre há o espaço.