A Vizinha

O som da bateria esfola-crânio não deixou eu ouvir a campainha, e quando levantei a cabeça, tomei um susto violento: tive a impressão de ter visto um zumbi, um homúnculo ou alguma coisa horrível do tipo. Perguntei a mim mesmo se eu já não tinha chegado ao nível de bebedeira do meu pai: se não estava tendo alucinações de tanto que o álcool ferrou com o meu cérebro. Mas feliz(ou infeliz)mente, o monstro provou ser real, olhando pra mim, de cara feia. E não se desfez, nem sumiu como mágica, que é o que as alucinações fazem: continuou lá, olhando pra mim. E só fui entender o que ele dizia quando me perguntou pela terceira vez:

– Qual é o seu problema?

Tinha hálito de sinusite envelhecida e de perfume barato. Dei-me conta então do que acontecia: era a minha vizinha, mas eu estava tão chapado que já estava pensando bobagens.

– Hein? Ah, oi, tudo bom...?

– Tudo bom coisa nenhuma, que barulheira é essa?

Imediatamente abaixei o volume. Putz, eram só 11:30 da noite. Velha imbecil, a noite tava só começando. Mas a quem eu quero enganar? Eu já tava acabado, precisava mesmo era dormir direito, na minha cama, e não jogado em cima do teclado, ouvindo Sarcófago no último volume. Quando eu pensei em dar uma desculpa, bati os olhos numa garota que estava atrás dela, uma gracinha, e com uns seios bem volumosos pra idade que dela, que devia ser uns quatorze ou quinze. Ela tinha um olhar assustado. Meu aspecto devia estar pior do que imaginei na hora. E nessa hora, meus amigos, lhes confesso que tive que tomar cuidado pra não passar vexame: minha calça ficou apertada, se é que me entendem, e eu dei graças a Deus por estar usando uma cueca de seda. O atrito não causa irritação, por isso, não precisei dar aquela ajeitada.

– E aí, gata, que tal deixar essa velha com cara de poltergeist e vir comigo pro meu quarto, fazer dois minutos e meio de ruídos selvagens?

É claro que eu não disse isso. Mas pensei em dizer. Só consegui ficar olhando pra ela de boca aberta, ora pro olhar azul arregalado lindo-lindo dela, ou pros peitos, que pra me deixar louco de vez, estavam de farol aceso. E detalhe que nós já estávamos no meu quarto, vivo numa quitinete. Sala e banheiro. A velha cara-de-homúnculo com cheiro de sinusite envelhecida saiu reclamando, dizendo que ia chamar a polícia da próxima vez. A garota seguiu ela, olhando pra mim de rabo de olho. Um tesãosinho. A garota, não a velha.

Como uma rotina de quase todas as noites, fui ao banheiro, escovei os dentes, me masturbei e tomei banho. Não necessariamente nessa ordem.

Ao deitar na cama, lembrei-me da minha falecida mãe, das brigas que ela tinha com o meu pai, ele bêbado, batendo nela; pensei em mim, no meu futuro, minha vida, essa merda toda. Meus olhos começaram a ficar marejados. Tenho que parar de beber, pensei.

E vomitei.