Um Milagre
Hoje um dia como qualquer outro, trouxe preocupações, receios, expectativas
e também memórias há muito adormecidas no meu inconsciente, tão bem
guardadinhas que há anos não pensava nelas. Enfim, hoje me lembrei de um
fato de aproximadamente de quase 4 (quatro) décadas já passadas, mas que
até hoje o tenho em mim, em minha memória como se tivesse acabado de
acontecer. Fato inexplicável , daqueles que não tem como explicar, ou você
acredita ou ....não tem outra opção, várias foram às testemunhas oculares
do ocorrido, mas, não quiseram se pronunciar, respeitei a decisão deles, não
irei citar nomes de nenhum deles testemunhas oculares e reais do fato e
também do menino o personagem central daquilo que chamo simplesmente
de "Milagre".
Tal fato deu-se assim:
Em uma manhã de sábado muito quente em pleno verão a areia quente da rua
não pavimentada fazia arder os pés descalços dos meninos que brincavam com
uma velha bola, embora suados estavam felizes, afinal era sábado e podiam então
brincar a vontade pois não era dia de aula.
Então de repente tudo para, todos param paralisados por um grito agudo que
ecoou pelo ar, avistaram então um menino vindo em direção a eles gritando,
chorando, com um cão nos braços. Achegaram-se ao menino:
_ O que foi?
_ O que aconteceu?
O garoto chorava, seus olhos azuis pareciam um oceano, grossas lágrimas se
assemelhavam a uma queda d,água que saiam daqueles olhos claros.
O choro alto e forte do menino espalhou de tal forma que fez com que a
vizinhança toda saísse a rua para ver o que estava acontecendo.
Cada vez mais o choro se tornava em lamento triste, entrecortados por soluços
profundos. Sentado na areia quente com o cão ao colo o menino se desfazia em
lágrimas. O cão estava morto, duro, frio com as patas esticadas, totalmente inerte.
Esse cão era companheiro do menino, onde o menino ia, o cão ia, até mesmo a
escola, o cão ficava no portão até a hora que o menino saia da escola e juntos viam
brincando pela rua até chegar na sua casa, ambos eram amigos um cuidava do outro.
Todos se condoeram pelo menino e pelo cão também.
O jogo de bola acabou, os meninos tentaram acalmá-lo mas em vão, até que se foram
cabisbaixo cada um para sua casa. Só os adultos ficaram, tentaram também tirar o
cão do colo do menino mas sem sucesso, então estes também se foram cada um aos
seus afazeres. O menino continuou ali sentado no meio da rua com o cão ao colo,
vez ou outra, um vizinho ou outro espiava para ver a cena que continuava a mesma,
até a mãe do garoto que acabara de chegar do trabalho também não conseguiu
convencer o filho a soltar o cão morto.
O sol de verão declinava a oeste e o menino ali, seus soluços ininterruptos constrangia
a todos. Até que então o menino colocou o cão na areia ainda muito quente e se
ajoelhou ao lado do cão, ajuntou as mãos e elevou os olhos aos céus e com voz
embargada repetia uma prece exatamente com essas palavras que ainda ecoam na
minha memória: "Meu Pai, Meu Pai do Céu não deixe meu cachorro morrer, faz ele viver".
Sua prece se tornou um lamento angustiado , o garoto não se cansava de repetir a prece
já era quase noite, tentaram novamente removê-lo dali, mas nada, nem mesmo a mãe
conseguia tirá-lo de perto do cão. Mais uma vez os vizinhos voltaram , com agrados tentavam
persuadi-lo mas nada, nada o removia de perto do cão. O sol a descerrar anunciava a noite,
o lamento continuo triste e agora a prece se restringia em uma única palavra:
"Misericórdia"! Até que o inesperado aconteceu, ao por do sol , mas precisamente ao crepúsculo
o cão simplesmente latiu e se levantou, o garoto ao cão se agarrou, chorava e ria também beijava
e abraçava o cão. Os expectadores faziam o sinal da cruz, outros mantinham-se perplexos.
E eu que presenciei tudo isso, me aproximei do garoto e do seu cão confirmando que era isso
mesmo, o cão tornou a vida ou a vida tornou ao cão, o choro e a súplica do menino tocou o coração
de Deus e eu senti vontade de chorar.....foi sim um Milagre.
Anos se passaram e o garoto agora adulto e o cão continuavam juntos.
Andradina - SP verão de 1979.
Tina Rosa
Campo Grande- MS 24/01/2023