Saudade da ficha telefônica
Que ninguém se apresse em me chamar de distraído, confuso ou coisa que o valha. Outro dia ouvi uma reclamação, que na minha história é, no mínimo, muito comum. Uma grande amiga havia me ligado e eu, só para variar, não estava em casa. Como é de costume dela, após o famigerado “bip”, ela gravou seu recado na secretária eletrônica. Dois dias depois, assim que cheguei em casa, e como é de meu costume, retornei sua ligação e descobri, com grata surpresa, que receberia sua visita no próximo fim-de-semana.
Ela chegou e, após ter se instalado, saímos para almoçar. Decidimos que um belo rodízio de carnes satisfaria a ambos. Escolhido o restaurante, começamos a árdua tarefa de nos empanturrar de comida. Para meu espanto, minha amiga, não só conhecia um dos gerentes da casa, como havia rompido um relacionamento de pouco mais de dois anos com o rapaz.
Passado o desconforto inicial, já que ela não sabia que o mesmo estava a pouco mais de uma semana trabalhando ali, e eu jamais havia posto meus pés em tal ambiente, o pobre moço fez a pergunta que não podia. Inocentemente inquiriu-a sobre o porquê de ela não dar atenção aos seus recados.
Imediatamente fui lançado no meio de um turbilhão de informações e acusações de ambos os lados que resultaram em uma pesquisa para a qual, imaginem, eu deveria ter a resposta, afinal de contas, eu retornava todas as ligações que recebia. Quando respondi que não eram a todas as ligações, mas sim, a todos os recados que retornava. Pronto. O mundo virou-se contra mim, e logo fui transformado de advogado em réu, já que a partir daquele momento havia sido alçado à condição de “homem igual a todos os outros”.
Antes que pudesse perceber estava sozinho na mesa do restaurante, com metade do mesmo me recriminando com seus olhares, com uma ligação de número desconhecido perdida no celular, e com uma amiga, extremamente, irritada a caminho da minha casa. É, que saudade da ficha telefônica.