Aprendi a ter medo de mim e me tornei a prisão da minha alma. Insensível aos meus sentimentos mais profundos, senti-me um lixo. Meu universo não tinha rumo, era cheio de incertezas e eu apenas caminhava.

          Um dia remexendo no passado, percebi que tinha muitas coisas escritas escondidas até mesmo de mim. Na pandemia apavorou-me a possibilidade real de morrer que eu mascarava sendo otimista nas redes sociais. Virei um influencer, sem milhões de seguidores, claro, e entrei no mundo irreal que já não me era estranho.

          Pensei: e se eu morrer? Ninguém vai me conhecer como realmente sou? Minhas dores, mágoas, ressentimentos, frustrações, manias, chatices e também o meu lado bom. Nunca mostrei a realidade, para não me machucar, e ergui um muro sem o portão de entrada. Minhas fragilidades sempre foram um segredo bem guardado.

          Decidi que era hora de derrubar esse muro e revelar meu segredo. Falar dos meus acertos, mas também dos meus erros, das minhas fragilidades, mas também quando fui uma fortaleza, das vezes que eu cai, das vezes que eu levantei. Abrir a porta para o mundo e me expor. Estava na hora de ser um ser humano normal e real.

         Mostra a minha alma não foi fácil. Não é tão simples admitir a nossa vulnerabilidade. Todos nós temos vidas diferentes, mas temos atitudes semelhantes, julgando ou criticando o outro, sendo que muitas vezes já fizemos coisas piores. Digo isso porque já fui assim. Eu era completo silêncio quando tinha de falar da minha essência e já fui arrogante com pessoas que tinham o mesmo problema que eu. Exigia delas uma coragem que eu não tinha. Irônico? Fraco? Ou apenas humano? Agora que estou livre para ser vulnerável não ligo mais para o que as pessoas pensam ou falam a meu respeito. É uma atitude delas que eu não consigo controlar.

          Meu despudor, minha desconstrução e a reconciliação comigo mesmo, foram importantes para construir o ser humano que sou hoje e nessa jornada encontrei pessoas que estavam no mesmo caminho. Uma taça de vinho, amigos, boa música, uma boa conversa e o alívio de poder ser autêntico, é o luxo da simplicidade. Não ter medo de ser feliz, não esconder nada e saber que vou ser aceito exatamente como sou, me leva a uma grande dúvida: existe limite para a exposição da alma? Ainda não encontrei a resposta, mas estou perfeitamente confortável com a minha vida ordinariamente comum, sendo um rapaz como outro qualquer.

          Parafraseando a grande Clarice Lispector: não tenho tempo para mais nada, ser feliz me consome muito. Viva a liberdade da alma!

José Raimundo Marques
Enviado por José Raimundo Marques em 25/01/2023
Reeditado em 25/01/2023
Código do texto: T7703839
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