AS LUZES DO MUNDO
(Baseada em um poema de Lucia Bauer)
Ontem a noite estava cálida. Eu, meu marido e nossos dois cães nos sentamos no jardim, como sempre fazemos quando as noites estão bonitas. Estávamos um pouco cansados, pois tivéramos um dia cheio, apesar de estarmos aproveitando férias. O calor dá essa sensação de termos feito mais do que fizemos.
Gosto de me sentar em minha varanda ao entardecer - coisa que não posso fazer fora do período das férias - e ver as luzes das casas lá em baixo se acendendo aos poucos, enquanto os carros passam na ponte em direção às suas casas. Depois, começo a escutar cães latindo alegremente, saudando seus donos, crianças brincando e sons vindos de aparelhos de TV. Em seguida, vem os cheiros de comida: alguém está fritando um bife, cozinhando arroz, temperando o feijão.
Antes de entrarmos em casa, costumamos colocar os cachorros para dormir; sim, eu sou aquela doida que põe os cães para dormir, desejando-lhes boa noite e dizendo "Fiquem com Deus, São Francisco de Assis, São Lázaro e São Roque." A luz da área de serviço onde eles dormem estava acesa, e pedi ao meu marido que a apagasse para que a gente pudesse ver as estrelas. Eu estava olhando para o céu naquele momento e vendo apenas algumas delas, um tanto apagadinhas. Assim que ele desligou as luzes, o céu se cobriu de estrelas cintilantes.
Para ver as estrelas como elas realmente são, com todo o briho que elas têm, precisamos ficar no escuro. O excesso de luzes artificiais encobre essa visão.
Para realmente ouvir alguma coisa, é necessário que haja silêncio; Para se ter uma visão verdadeira sobre o mundo, é necessário antes olhar para dentro e compreender (mesmo que parcialmente) o que vemos, quem somos. É necessário admitir erros, falhas de caráter, medos, invejas. E acima de tudo, desejar, realmente, mudar. E não é através da negação dos nossos defeitos que mudamos. Isso só acontece quando os aceitamos totalmente, sem nos condenarmos exageradamente, mas compreendendo que tudo o que sentimos e somos faz parte do caminho e nos conduz a um aprendizado maior.
E só podemos aprender de verdade sobre nós mesmos. De nada adianta querer interpretar a Deus, ou às outras pessoas. Quem sabe, se nos conhecermos, seremos capazes de conhecê-los um pouco também, mas sempre admitindo que podemos estar errados. Porém, quando nos enxergamos como somos, automaticamente a nossa visão sobre as outras pessoas e seus propósitos melhora bastante. Quando reconhecemos nelas um caminho pelo qual já passamos, fica mais fácil entender suas reais intenções.
É preciso mergulhar na escuridão para que possamos realmente ver as estrelas, aqui do lado de fora.
É assim dentro da gente também.