Não há individualidade

Ontem à noite vi uma matéria dessas vagando na rua. Uma mulher invisível. Magra como pau de vira tripa, barriguda como um baiacu, pé inchado com elefantíase, negra como a noite já não o é.

Vagava só, com seu rebento na barriga, revirando lixo para ter o que comer.

Era uma mulher invisível em sua existência. A cada um que abordava, nem mesmo um olhar e ver-te o ventre do qual brotará.

A matéria humana, carbono, matéria morta, será absorvida pela terra. Mas enquanto viva, reage.

Vive-se por insistência.

Age por sobrevivência.

E não adianta fingir que ela não existe.

Corre-se o risco de tornar nossa permanência doentia: adoece-se o espírito, apodrece-se os instintos, torna-se cego por hábito, paralíticos morais, drogados para não pensar, televisivos no ar...

Não enxergar o próximo é a postergação de um problema.

Vive-se a ilusão de um sonho individual.

Mas o indivíduo inexiste. Pouco nos damos conta disso.

Nascemos de um outro e nos mantemos por tantos outros.

Quando jazemos fica somente a memória da nossa existência, se de fato tivermos existido para o mundo (por quanto mais se der, mais assim serás tu lembrado, perdurando a seus feitos, desejos e pensamentos).

Temos que recuperar o motivo da matéria

Transformar essa realidade atroz.

Subverte a ordem tecnológica.

Tecnologia para viver e não viver para a tecnologia.

Nos distanciarmos do virtual e nos aproximarmos do real.

Talvez assim haja caminhos: a busca coletiva para muitas soluções

By FVL em 2018