Eu tinha quatorze anos quando adentrei pela primeira vez como professora. Tenho um pouco mais de quatro décadas de docência. Presenciei muitos momentos difíceis desse nosso pobre país. Tudo aqui foi tardio... a independência, a república, a democracia...enfim, a civilização. Nosso maior sonho estúpido era seguir os padrões europeus, e mais tarde, os norte-americanos, tão bem caracterizado pelo Tio Sam.  

Na minha família, cinco gerações de professores e professoras. A docência está no sangue, na vontade de explicar, de acolher, de prover o crescimento intelectual e corporal das crianças, que viram adolescentes e depois adultos...

Fui cursar Direito na vã tentativa de deixa de ser professora, e por fim, virei professora universitária de Direito... A sala de aula, era um campo fértil para resgatar muitas almas relegadas ao abandono, a miséria e ao descaso de uma sociedade voraz e competitiva. A cada pequeno progresso, eu vibrava como se fosse a Copa do Mundo... Alguns anos depois, encontrei uma aluna que me reconheceu, não obstante estar naturalmente envelhecida... E, em sua voz, senti o carinho do reencontrar-me e, com sorriso nos lábios, me revelou: sou professora tambem... e, imito a senhora em tudo que na minha memória está registrado como importante. A senhora nunca permitiu que a gente desistisse. Não importava o clima, as diferenças, a indiferença e, sobretudo, a carência afetiva que alguns discentes traziam esculpida no olhar triste como uma navalha afiada...
Cortava meu coração, ver que um simples gesto de atenção era o bastante para renovar a bateria e, prosseguir na luta pela sobrevivência. -  Professora, eu devo muito à senhora. Mesmo quando brava reclamava de mau comportamento... A escola era meu segundo lar, ou até mesmo o primeiro lar... Posto que não o tinha... e, ver que as pessoas se importavam comigo, fazia-me acreditar e prosseguir... -Posso lhe dar um abraço?  Eu vermelha como um pimentão maduro, acenei com a cabeça. O cenário era um supermercado... e todos em volta ficaram extasiados em perceber aquele encontro e, a minha frontal timidez... Dei meu telefone celular para ela... e nos despedimos..  Serei, eternamente, a professorinha... A que explica, a que ralha e, principalmente, aquela que se importa com o outro, porque é um ser humano, porque é ou foi meu aluno ou aluna, e, principalmente, por ter líquido e certo direito à dignidade humana. Ao sair do supermercado, a uma lágrima rolou no canto dos olhos...Eis o preço da emoção.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 12/01/2023
Reeditado em 17/01/2023
Código do texto: T7693249
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