Dúvidas

Se temos dúvidas há algo de positivo nesse fato aparentemente angustiante, é sinal que o cérebro está em busca de sinapses neurais que nos conduzam à saída do labirinto. Se temos opções e nos é difícil escolher tudo indica que a solução oculta-se atrás de uma das portas ao nosso alcance a um girar de maçaneta de distância.

Quem de nada duvida está alienado ou completamente equivocado em seu oceano de certezas nas quais somente ele crê. Esse tem grandes chances de despencar do abismo de soberba que o afasta da realidade. Duvido sobremaneira de quem não titubeia nem sente por vezes a alma dividida e as mãos trêmulas diante de uma decisão que mudará o curso de sua vida. Quase sempre é impossível retroagir: a palavra lançada, o mergulho no escuro, o desvendar de um segredo. Não há como recobrir o descoberto, ignorar uma revelação ou epifania. Muitas vezes existe conforto na ignorância, pois o conhecimento demanda atitudes que nos ferem. Contudo, a correção dessa miopia diante do mundo é necessária para a evolução e isso requer escolhas incessantes, daí as dúvidas.

Quem nunca morreu de medo de escolher um lado pensando nas vantagens que o outro oferece? Mas aposto que o lado escolhido terá sido o que mais se adaptou ao modo de ser e agir de cada um na hipótese de um indivíduo minimamente sensato. Nunca ganharemos com as duas faces da moeda, precisamos escolher porque é a regra do jogo. Dá alívio escolher, a dúvida se dissipa rapidamente e partimos para outra dúvida (são tantas por dia…). Ficar pendurado por um fio de dúvida que não faz o menor sentido, é corrosão garantida.

E é curioso como esses momentos de decisão jamais têm fim partindo do prosaico como um sabor de sorvete até o essencial como a escolha de algo determinante para o nosso futuro, que fará parte de nós. Ter dúvida é ao mesmo tempo ter a coragem de ficar diante do espelho mudo que nos observa e nos orgulhar de não termos cedido nem desistido quando a estrada se bifurcou. Sem o sentimento dúbio a gente deixaria de andar para frente e progredir pavimentando a estrada que antes era esburacada e incerta, ter dúvidas no fundo nos dá a certeza da conquista de algo maior mais adiante mesmo que no momento não entendamos de que se trata. Parece paradoxal, mas é libertador exercer o direito de escolha arcando com seus ônus e bônus enquanto muitos encontram imensas barreiras de toda sorte para fazer valer esse mesmo direito.

Nilza Freire