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É madrugada, as luzes da noite se apagaram. Estamos imersos no silêncio de uma noite sem fronteiras, vagando na correnteza dessa solidão tão bela e absurda. Parece que também anoiteceu dentro de nós. Quando fecharmos os olhos para descansar; quando jogarmos o fardo do cansaço e das lágrimas no abraço escuro dos sonhos; quando o vício da vida, por algumas horas, parar de pulsar em nossas veias, repouzaremos a cabeça nessa cachoeira clara e mansa da madrugada.

Parece que não há vida nessas noites. O mundo se apaga e os gritos lá fora se transformam em sussuros ardentes no calor febril dos sonhos.

A solidão não é mais solidão. É uma música que o coração ouve, melodia silenciosa que transborda da noite.

Não tenho nada. Não desejo nada e não importa se acordarei ou não amanhã. Sou todo abandono, escuridão e mutismo.

Meus sonhos se transformaram em uma absurda e insuportável lucidez. Me tornei refém da vida, como um escravo é refém de suas correntes.

Parece que o mundo nos virou as costas. Parece que o afeto, o amor, as esperanças nos abandonaram e nos restaram apenas o arrastar fatídico e monótono dos dias, das horas, dos segundos que ferem nossa alma como espinhos.

Tudo passa, tudo se move e ficamos parados como pedras na beira de um precipício. Lá fora é tudo silêncio e indiferença. Não existimos e ninguém nos espera em algum lugar. Apenas vivemos, persistindo nessa corrida sem um ponto de chegada, sem um horizonte onde possamos ver um porto para descansar. Somos uma pergunta boba sem uma resposta. Somos uma piada sem graça para o mundo. Nos acostumamos a conviver com o desprezo gratuito, com a indiferença e solidão sem compaixão que o mundo colocou diante de nós. Onde encontrar um refúgio senão dentro de nós? Dentro de nossas mentes aflitas. Em uma canção, na chama quente e brilhante de um cigarro. Estamos indo embora, estamos morrendo de uma morte lenta e paciente. Ninguém vê, mas talvez já estejamos mortos...

Um homem sem amanhã é apenas um fantasma, uma imagem vazia e indefinida de si próprio. Como nos tornamos isso? Olhamos uns para os outros e o que vemos nos assusta.

Janielson Alves
Enviado por Janielson Alves em 06/01/2023
Reeditado em 06/01/2023
Código do texto: T7687942
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