O ABRAÇO DO REI PELÉ
Eu pensava que ele era enorme. No imaginário de um futebolista amador, amante incondicional de uma boa partida e do único esporte que praticou exclusivamente até os cinquenta anos, ele era, de fato, enorme. Único tricampeão do mundo, mais de mil e duzentos gols pelos gramados, recordista de gols com a camisa da seleção brasileira, era ou não era um gigante?
Mas o tamanho a que me referia acima era físico. Um imaginário que se dissolveu quando o vi em minha frente e ganhei dele um abraço. O abraço do Rei. Em que circunstâncias? É o que relato a seguir.
O ano era mil novecentos e noventa e oito, ano da Copa do Mundo na França e eu residia em uma cidade próxima a Versalhes, chamada Montigny-le-bretonneux. Estava de passagem pelo país e cursava o Doutorado em Divulgação e História da Ciências, na Universidade de Paris XI, em Orsay.
Um amigo brasileiro, antigo lutador de judô da cidade de Florianópolis, vivia na cidade da periferia de Paris chamada Kremlin-Bicêtre. A gente se encontrava de vez em quando em Paris para tomar uma cerveja e nos visitávamos ocasionalmente. Nossas companheiras e nossos filhos também se tornaram amigos. Como amigos brasileiros vivendo temporariamente na França eram raros, nossa amizade floresceu.
Um belo dia, com a Copa se aproximando, meu amigo me informa que o Joãozinho Trinta, ele mesmo, o carnavalesco premiado da Beija Flor do Rio de Janeiro, estava ajuntando pessoas para participar de um desfile carnavalesco pelas ruas de Paris durante a Copa. E o galpão da “Escola de Samba” improvisada era bem próximo à sua casa. Lá fui eu conhecer o galpão, conhecer o Joãozinho Trinta e me apresentar como sambista voluntário para o evento.
Chegando ao galpão, nos apresentamos (meu amigo já havia se apresentado), conversamos com as pessoas, participamos de alguns ensaios, pegamos as roupas com as quais desfilaríamos e ficamos por ali, de papo com os instrumentistas, esses, sim, profissionais do samba levados do Brasil. E adivinhem quem chegou? Ele, o Rei Pelé, com sua presença marcante, seu sorriso e sua disponibilidade para o abraço. Foi então que ganhei o abraço do Rei, depois de algumas trocas de palavras.
Outro presente que ganhamos, eu e meu amigo catarinense residente em Florianópolis, foi o mais inusitado possível, não imaginado. Ganhamos a incumbência de desfilar ao lado da Globeleza, aquela bailarina que fazia um bailado nas aberturas dos carnavais na televisão, totalmente nua e com o corpo cheio de pinturas. Nosso papel era de guarda-costas dela, nós que éramos grandes e com caras respeitáveis.
O desfile da Escola de Samba foi no Jardin des Tuileries, entre o Museu do Louvre e a Place de La Concorde, no coração de Paris. Além da participação no desfile, algo inédito em minha vida, guardo esses dois presentes para minha memória e para minhas histórias. Ganhei um abraço do Rei e fui, durante umas três horas, guarda-costas da Globeleza, de quem ganhei também, lógico, um abraço. Só que ela já estava vestida.
Paulo Cezar S. Ventura (pcventura@gmail.com - @pauocezarsventura)