Os cartões guardados

Havia decidido fazer uma faxina em casa: limpar os cômodos, varrer, passar pano, tirar poeira dos móveis (o que detestava, mas não poderia se isentar da ação); reorganizar os livros, separar roupas que não mais usasse e se desfazer dos muitos papéis guardados ou largados nas pastas, nos cantos, nas caixas, como se ensaiassem alguma importância àquela altura. Começou!

Limpou o chão, lavou o banheiro e as janelas, encheu mesa, bancadas e cadeiras com os livros para organizar. Pegou uma caixa e, nela, vou jogando os papéis que não serviam para mais nada. Eram notinhas de compras, pequenas anotações, ideias, listas diversas e por aí ia. É 25 de novembro, nada melhor que uma limpeza total no aniversário para começar um ciclo, assim pensava, assim seguia.

Mais de quatro horas de trabalho e quasse tudo estava pronto. Uma caixa e meia de papéis para descartar, somando os materiais da faculdade que não mais usaria. É tralha que não acaba nunca, resmungou ao ver uma pasta sanfonada que ainda faltava. Abriu-a apostando só ter porcaria, e metade realmente foi para o descarte, mas a outra parte tinha ternura: eram desenhos, poesias e crônicas ali esquecidas, uns cartões guardados em branco.

Quem guarda cartões em branco? , debochou de si. E, como se seu eu de tempo anterior fosse ao pensamento responder, ouviu mentalmente que havia guardado os cartões sob alegação de serem muito bonitos para o envio, que esperaria ocasião especial. Tolo! Quatro lindos cartões, que poderiam ter marcado especialmente o dia de alguém, o natal, aniversário (vai saber), guardados naquela pasta a espera de um momento especial, da hora certa.

Aproveitou o dia para se desfazer das cartas que já havia recebido; jogaria todas fora, até que três envelopes chamaram atenção: eram cartões de natal recebidos de diferentes amigos, cartões lindos e que marcaram especialmente aquela data. Guardou as três correspondências e o resto foi para o fogo. Não fazia muita diferença se desfazer das cartas, anos haviam se passado e todas as pessoas, remetentes e destinatário, não eram mais os mesmos, justificava.

Não conseguiu se desfazer dos três cartões de natal recebidos, mas escreveu nos cartões que guardou de anos, para saudar os amigos.