Um instante de domingo
Seria só eu naquele parque se não fossem os sons das crianças e dos pássaros. Dois seres encantadores que emitem sons ora irritantes ora libertadores. Nos fazem sentir humanos. Quem seriamos nós se não conseguíssemos sorrir aos encantos naturais das crianças? Apenas uma táboa sem vida que um dia foi árvore.
Eu sei sentir este prazer gratuito que as crianças nos dão. Também consigo brincar com elas por uns cinco minutos. Grau máximo da minha humanidade.
Já com os pássaros minha relação é mais próxima, porém platônica. Eles não sabem que eu existo. Encanto-me por suas diversidades de sons, por isso não consigo dedicar-me ao amor de um só.
Feliz daquele profissional, o qual não sei o nome, que sabe identificar cada ser sem precisar vê-lo. Eu preciso da visão pra sentir o amor com nome. Enquanto não o identifico eu apenas o ouço, e ele não se completa dentro de mim.
De repente só ouço as crianças. Os pássaros se calaram em minha mente. É que a mãe de alguém gritou mais alto. Ouvi o clique do celular ao registrar uma foto. Olho para trás e uma moça posa para uma foto, ou várias, ao lado e um extintor de incêndio. Visão pequena. Um parque cheio de flores, madeiras, arvores entrelaçadas de verde e ela escolheu registrar aquele momento debaixo de um quiosque com teto de palha seca ao lado de uma caixa vermelha.
Olho para a silenciosa cidade ao pé do parque. Um privilégio não ouvi-la. Hoje é domingo e a vida anda mais devagar. Por isso estou aqui escrevendo, porque a vida dentro de mim me deu uma trégua. Apenas o celular insiste em me tirar este momento rebelde. Quero apenas este instante solitário com os pássaros. A vida na telinha sentada os meu lado pode esperar. Eu esperei a semana inteira por este encontro comigo. Não vou me distanciar.
E mesmo que esteja na hora de ir embora, conseguirei levar este instante semana afora.