BAILE DE MÁSCARAS

A vida não passa de um grande baile. De máscaras. Pierrôs, colombinas e arlequins são os advogados, frentistas, prostitutas, padres, donos de boteco, donas de casa, aposentados, motoristas de Uber, carrascos, policiais, pais em geral, filhos em geral, avós em geral, todos em geral, salva-vidas, quituteiros, donos de pensão, pensionistas, vendedores, travestis, ladrões, barões, garçons, porteiros noturnos, veterinários, astronautas, malabaristas, atores, juízes, diretores de cinema, faroleiros, carcereiros, pedintes, copeiros, cartorários, feirantes, camareiras, chefes de cozinha, dentistas, surfistas, pais-de-santo, encanadores, arquivistas, passistas, traficantes, sucateiros, carteiros, sopranos, corredores de kart, bancários, músicos de orquestras com seus maestros, idosos, trompetistas, obesos, saladeiros, gays, leprosos, protéticos, fanfarrões, cafetões, artesãos, alfaiates, aeromoças, moribundos, encanadores, poetas, cadeirantes, jogadores de polo, maratonistas, políticos, psicólogos, videntes, veganos, psicopatas, presidentes, falsários, legistas, homeopatas, mergulhadores, bicheiros, confeiteiros, deuses, siameses, pasteleiros, cegos, mesários, pilotos, monges, adictos, coveiros, mendigos, falsários, domadores, múmias, maquiadores, mercenários, índios, pintores, ermitões, náufragos, barítonos, bedéis, protéticos, ciclistas, devotos, cunhados, caolhos e capoeiristas. Enquanto a música persistir, o baile persiste. Cada um, devidamente ornamentado e mascarado, vai fazendo sua parte no show, compondo essa trupe conhecida como raça humana. De repente, para a música. O silêncio se mistura ao ar, trepida tudo num turbilhão alucinante. As máscaras então vão ao chão, em uníssono estrondo que arranca Deus do seu cochilo. As pessoas, desmascaradas, ficam que nem baratas tontas, olham entre si, estupefatas, não sabem o que fazer, o que dizer, pra onde ir. Suas máscaras eram suas almas, seu condão existencial, seu amálgama, armadura do mais poderoso titânio. Sem elas, não fazia mais sentido bailarem até secarem seu suor, até reluzirem seus ossos. Ficam assim até sempre. Então deitam ao chão, num solene gesto, aguardando o recomeço da música, que nunca mais acontecerá. Quisera poderem retomar seu bailado original. Quisera poderem voltar a se esconder atrás daquelas máscaras atrozes, que lhes salvaguardava numa trincheira indevassável. Ficarão assim numa espera que vai romper dias e noites sem trégua. Triste destino de toda essa gente. Nossa gente. A gente.

Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 08/12/2022
Código do texto: T7667517
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