Amor permitido
Renato é professor universitário, 65 anos, vida reclusa por opção. Sente-se feliz com o padrão de vida que escolheu para si e parece transmitir segurança e estabilidade provenientes dessa felicidade. Ou vice-versa. É professor por vocação e sabe como se deve comunicar com os jovens, pois, apesar da imensa diferença de idade, tem mente jovial.
Antes ou depois das aulas é invariavelmente procurado por algum estudante para um aconselhamento, uma orientação ou mesmo para emprestar um par de ouvidos a um iminente desabafo. Renato faz isso com devoção. Um desses estudantes que o procuram é Lucas, 22 anos, inteligente, inseguro, valente, indeciso. As conversas iniciais esclareceram dúvidas sobre carreira e encaminhamento profissional.
Lucas apreciava o senso de humor de seu professor bem como o modo claro e prático com que respondia suas perguntas. Gostava muito de empregar exemplos reais, muitas vezes colocando-se na questão. O Interesse de Lucas por inúmeros assuntos crescia e a vontade de Renato de conversar e questioná-lo, também. Lucas aboliu o “senhor” atendendo um pedido do próprio Renato. Afinal, sempre que ele estava na faculdade, os dois invariavelmente se encontravam para conversar. Assuntos nunca faltaram e a mente curiosa do Lucas precisava por vezes ser refreada, para que não corressem o risco de ficarem trancados no campus.
Lucas não tinha bom preparo físico, mas ultimamente estava se exercitando na própria faculdade e gostava de exibir alguns dos seus feitos. Gostava das barras e, ao se erguer, seu abdômen ficava desnudo. Renato olhava furtivamente, cheio de sentimentos mistos. E, ao olhar aquele corpo jovem, belo, viril, latejante, ficava ainda mais apreensivo e confuso. Uma parte dele dizia sim; a outra, não.
Renato se perguntava se entre os dois corria uma comunicação paralela, numa linguagem que prescindia de palavras, mas não dos minúsculos gestos significativos, dos olhares dissimulados, das vontades e desejos escancarados ao mesmo tempo que encobertos. Havia apenas uma certeza, a de que era ambíguo: se por uma lado havia sinalizações, por outro nada se materializava. E se tudo não passasse de imaginação? De sonha plasmados? O impasse para Renato era: continuar como está e fruir das graças do certo incerto, ou conversar abertamente arriscando lançar-se numa imensa decepção, até mesmo à exposição ao ridículo extremo?
Lucas tornara-se muito zeloso com Renato; tratava-o com dedicação, respeito, consideração e com um algo a mais que estava ali sim, mas cuja forma era indefinida. Seria admiração? Gratidão? Reconhecimento? Fascinação? Encantamento? Tudo parecia tão óbvio, na mesma proporção que parecia nebuloso. Quando conversavam, o entusiasmo os envolvia de tal modo que seria natural se ficassem de mãos dadas, acariciando-se mutuamente, mesmo que por frações de tempo.
Renato aguardava com ansiedade os dias em que poderia ver Lucas e conversar com ele. Lucas era mais claro: expressava esse sentimento em palavras. Mas, e daí? Ao final das conversas, Renato ia para casa como que flutuando, ao mesmo tempo em que se sentia aliviado por não ter sucumbido e porque nada de concreto acontecera. Tudo permaneceu na segurança do ambíguo.