O menino do mercado .
Ela acabara de sair do supermercado, esbaforida no estacionamento, tentava abrir o carro. Ele,sempre prestativo, eufórico com o primeiro emprego, ofereceu ajuda. Gentileza gera gentileza; olhares e sorrisos foram trocados entre movimentos de guardar as compras e agradecimentos. Ela logo se foi, mas guardou a boa impressão, a educação e mesmo ainda no trânsito a caminho do consultório sentia escapar-lhe no cantinho da boca um riso refrescante ao lembrar da cena. Ele continuou seu trabalho no estacionamento, mas a cada carro se pegava buscando minuciosamente no interior se por acaso não seria a " Penélope charmosa" de novo. Pois bem, dois dias depois ela voltou e tudo como em um rito religioso se repetiu, até que de súbito, ele vermelho como pimentão pediu o número de celular. Conversaram muito,por vários dias até que ela voltou ao supermercado no horário de saída dele; foram para o Morro do Cristo e conversaram por horas, se perceberam namorando. Tudo era tão suave e mágico que ninguém imaginava um desfecho diferente de felicidade. A menina doutora era mais velha, o menino do estacionamento também não era da mesma classe social. A família dela não aceitara, mas continuaram escondidos até que um primo viu os dois juntos, deu uma surra no menino e contou para a família que imediatamente mandou os dois para morar fora do país. Triste e deprimido,após sair do hospital o garoto não queria saber de vingança, continuou aos trancos e barrancos trabalhando e estudando. Semana passada uma amiga postou um texto de despedida para a menina doutora que havia sido mandada embora para outro país junto com o primo que lá, numa crise de ciúmes, estuprou e matou a menina doutora e depois se matou. Hoje meu amigo do estacionamento não aguentou e tirou a própria vida.
A vida vira uma merda quando a gente se deixa levar pelo o que os outros acham, quando permitimos que interfiram.