Como ser um neurótico (e como deixar de ser)
Tem coisas que a gente não entende ou não sabe como começou. A gente imagina, mas não tem certeza. Tem coisas da gente que a gente aceita como um fato, uma realidade que não pode mudar. E, então, de repente, tudo é possível e aquele sofrimento, que parecia destino, vai deixando de continuar. Hoje, eu fui comprar uns doces para a sobremesa depois do almoço de sábado. Demorei não mais que cinco minutos para ir ao local onde os comprei e voltar para casa. Eu percebi que a minha respiração não estava ofegante e não senti que eu era um inquilino desconfortável dentro do próprio corpo. Tudo porque eu parei de puxar a barriga para cima. Já fazia um bom tempo que fazia isso, quando um amigo notou esse meu hábito estranho e recomendou que parasse. Eu não sei quando começou mas sei que, teve uma vez que a minha mãe notou minha barriga proeminente, resultado de uma combinação de genética desfavorável, sedentarismo extremo e alimentação irregularmente saudável. Me lembro que estava de noite e preparando para ir a um evento na escola. Ela reforçou ou me ensinou a sentir vergonha quanto ao estado de flacidez em que me encontrava. Não fez por mal, mas fez e passei, como um bom aluno, a seguir sua dica em forma de reprovação. Eu internalizei uma crítica negativa de maneira visceral. A partir daí, passei a cansar mais quando andava na rua e a sentir um constante incômodo no abdômen por causa dessa tensão adquirida e concentrada em torno do umbigo. Sempre achei que o incômodo fosse apenas pelo excesso de gordura localizada e o que os outros iriam dizer. Hoje, sei que era muito mais que isso, que vinha literalmente do esforço inútil que fazia para manter minha barriga suspensa, acima de sua posição mais natural. Hoje, eu consigo até respirar pelo nariz sem perder o ar, de me sentir em casa dentro do meu próprio corpo, mesmo se a barriga continua ali, se não sei se conseguirei reduzir totalmente a sua exuberância algum dia. No início, foi difícil me acostumar com a minha envergadura 10 cm maior que a minha altura, mas agora eu já estou gostando de ser a mim mesmo... das tantas neuroses que eu já adotei como se fossem reflexos verdadeiros do meu ser, esta eu sinto que estou conseguindo superar.