A BODEGA DE DONA TUTA

26 de novembro de 2018 ·

 

Fragmentos:

Memórias da Vila

(A bodega de dona Tuta)

Na curva da estrada , duas portas grandes de madeira era quem primeiro reverenciava o sol que erguia-se por trás dos cinamomos.

Sem demora abriam-se para as paralelas de chão batido e ,não raro,um carroçeiro e outro,acenava sua suposta felicidade à dona da venda.

Sobre a mesa,os tinteiros ostentavam as carrancas de indios - "Guarani" era a marca - e as penas,mergulhadas,punham-se à postos para as primeiras anotações.

Ao lado,a resma de papel de embrulho,a "mãozinha" de metal prendendo anotações e a cadeira,solene à espera daquela que escreveria o diário do estabelecimento.

Pela janela lateral,vindos do jardim,odores de goivos e cravinas sem nenhum pudor invadiam o ambiente.

Garrafas enfileiradas,sabão,marmelada,doces,salgados e alguns enlatados dividiam espaços entre as prateleiras de madeira bruta.

Nos caixotes ,os grãos,os cereais , a concha medidora...

A ferradura entre as portas e o guiné preso ao laçarote vermelho eram amuletos contra o "olho gordo".

A pasmaceira daqueles dias dos anos 50 quebrava-se em pequenos cacos assim que aportavam os fregueses.

Dona Ortilisia era costumeiramente a primeira a chegar.

Serena,mansidão nos olhos e um riso perene desenhado na face.

As saias longas, rendadas,faziam-lhe uma espécie de baiana.

Saía com alguns embrulhos e pão fresquinho.

Depois vinha Seo Bigode.

Prendia a parelha de cavalos ao tronco do cinamomo e ingeria um pequeno gole da purinha.

Por vezes um gritinho da menina Aurora vindo lá dos fundos da moradia,quebrava o encantamento.

O Senhor Sérgio,sisudo e compenetrado proferia em voz forte:

-"Mas que diabos faz Aurora?... "

Assim corriam os dias na bodega de Dona Tuta.

Uma curva de caminho onde a borracha do progresso,apagou a sépia do tempo .

IRATIENSE THUTO TEIXEIRA
Enviado por IRATIENSE THUTO TEIXEIRA em 26/11/2022
Reeditado em 26/11/2022
Código do texto: T7658469
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