BURNOUT: Não deixe as chamas consumirem o que há de bom em você

Poderia ser uma frase de publicidade para um slogan de alguma marca de enérgico. Poderia ser uma tradução de um filme americano qualquer que vem para o Brasil com aqueles subtítulos enormes. Poderia ser uma frase de efeito usada numa palestra de Coach pra levantar a motivação da galera que pagou pra isso.

Mas, na verdade, é apenas uma frase que tenho colocado na minha cabeça -ou tentando pelo menos- nos últimos dias.

Sempre quando estou cansada e triste, eu penso no meu passado e no quanto lutei para chegar até aqui. Foram anos querendo estar onde estou hoje. Por que não estou grata por tudo isso? Se a garota de 4 anos atrás estaria se sentindo eufórica com quem sou hoje, então porque eu de hoje não estou me sentindo grata e eufórica com quem sou hoje?

Talvez porque é natural do ser humano reclamar daquilo que vive no presente, almejar um futuro, por vezes, inalcançável para si e dizer que o passado foi sua melhor época da vida (mas na época ninguém realmente achava isso). Talvez porque eu me esforcei tanto que deveria colocar algum reconhecimento por ter realizado alguns dos sonhos que achei que seriam impossíveis. Eu do passado pensava que:

- iria casar e ter filhos e um cachorro.

- Iria conseguir trabalhar na melhor empresa da área da minha faculdade

- Iria ser uma escritora de sucesso por ter começado a carreira tão jovem (aos 12, mas publicada oficialmente aos 17)

- me formaria em jornalismo

Hoje eu não casei (nem tenho um cachorro, muito tenho filhos). Me pego pensando que minha vó e minha mãe se casaram aos 30 e ambas acharam que eram velhas demais (e eu também acho) MAS PQP É DAQUI A 5 ANOS!!!! O fato é que eu acho que sou velha, mas ao mesmo tempo não me sinto tão velha assim quanto eu achava que os 30 seriam. Sei lá. Faz mais sentido pra mim casar aos 30 que aos 20. Mais estabilidade, melhor financeiramente, mais bem resolvida comigo, mais madura, mais tempo pra conhecer a pessoa ideal. Por que mesmo que tenho a sensação que os 30 é velha demais pra casar?

Lutei por anos e anos em mais de 20 entrevistas de emprego levando não por não ter experiência, mas entrei na melhor empresa da área da faculdade, e só precisei de um sim. Sem a necessidade de QI, sem conhecer ninguém lá de dentro.

Não me tornei escritora de sucesso e me irrito com esse tipo de pensamento hoje em dia, porque eu tenho um conflito interno com aquilo que vende e aquilo que é bom. Nem sempre o que vende é bom. O nome já diz assim “best seller”. Ou seja ser um dos mais vendidos não significa que você é bom, só significa que as pessoas compram aquilo que você escreveu. Se esse não for um pensamento de escritores que realmente se preocupam com qualidade de seus textos, Stephen King que atire a primeira pedra.

Não me formei em jornalismo e, inclusive, nunca na minha vida me imaginei como jornalista (nem na época em que estava na faculdade de jornalismo). Se tem uma coisa que eu aprendi é: NÃO FAÇA JORNALISMO SE O QUE VOCÊ GOSTA É ESCREVER. Você tem que gostar da profissão, não do que ela faz. Aliás, é bem difícil que no jornalismo você possa soltar sua criatividade quanto aos mundos fantásticos que vivem na cabeça de um escritor de fantasia. Sério. É mais fácil você falar sobre quem morreu hoje atropelado por qualquer veículo na rua do que sobre o ser mágico e interessante que tem como poder a capacidade de dar choque nas pessoas com a mente.

E a questão é que: para todas as coisas das quais eu achei que teria concluído até o período em que estou, poucas foram as que eu consegui (embora tenha levado anos tentando). E, ainda assim, embora eu tenha ficado feliz e grata, com o tempo fui percebendo que junto com o sonho e as expectativas, vem também a frustração.

“Não é do jeito que eu esperava”, “paga bem mas tem que dar a alma pra estar lá”, “não tenho tempo nem de dormir, quem dera comer, sair ou fazer qualquer outra coisa que pessoas da minha idade fazem”, “eu nem deveria estar mais na faculdade, deveria?”, “e se eu não casar aos 30? Vou conseguir casar depois?”

A tristeza e o cansaço se tornaram tão normais pra mim, que eu via a vida passar diante do piloto automático e só aceitava que tínhamos que nos sacrificar pelo futuro. MAS QUE FUTURO? Um futuro que continua incerto independente daquilo que eu fizer? Um futuro que pode tanto me levar a um casamento aos 30 anos como um acidente de carro fatal? Um futuro sem os momentos especiais com amigos, família e pessoas que você mais ama?

E foi aí que eu percebi que não estava mais curtindo a vida, e sim vivendo em função daquilo que dizem que é um sacrifício necessário. Desculpa, mas é o mesmo que até hoje fazem com a romantização da medicina. Quem não é da área da saúde ou que quer entrar só pensa no sonho, mas quem é de dentro pede por um dia de descanso e sabe que nem sempre o sacrifício tá valendo a pena. Não dá pra romantizar os sacrifícios inviáveis, as noites mal dormidas e as refeições em 15 minutos só porque você faz uma profissão que em tese cuida da saúde do outro (mas esquece de você mesmo todos os dias).

Se você morrer amanhã, você teria chegado no futuro que você tanto se sacrificou pra chegar? Ainda que você chegue, duvido que seja feliz nele. Faça sacrifícios a vida toda e não viverá. Na realidade viverá das chamas daquilo que te consome e não terá aproveitado nenhum momento da sua vida direito.

E se para viver eu precisar sair daquilo que um dia eu sonhei e andar por outros caminhos, olha, sim, eu escolho viver. Eu escolho dar meia volta no caminho que percorri dentro do meu labirinto de folhas farpadas e sair da rua sem saída que eu me enfiei na esperança de que o sacrifício da vida me levaria a um futuro feliz.

Bekirie
Enviado por Bekirie em 25/11/2022
Reeditado em 25/11/2022
Código do texto: T7657968
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