O XADREZ DOS BICHOS: “O TORNEIO”.
Em um misto de fantasia e imaginação, foi realizado o primeiro campeonato de xadrez entre animais, em nível mundial.
O evento aconteceu em uma área de Mata Atlântica, da Serra da Mantiqueira, no sul de Minas Gerais, bem próximo das divisas com os estados do Rio de Janeiro e São Paulo.
Sob supervisão da FIDE e federações dos três estados citados, o torneio foi anunciado para o mundo todo, convidando animais de todas as espécies, que quisessem participar e, claro, até completar as sessenta e quatro inscrições previstas no folder.
Foi uma corrida louca para a inscrição.
As sessenta e quatro vagas se esgotaram no primeiro dia, já à noite.
De acordo com o anúncio que correu o mundo, só poderia se inscrever um animal por espécie, e assim foi feito.
O local escolhido era uma área com grande estrutura, no meio de mata, e adaptada, melhor ainda, para esse grandioso evento.
Para se realizar um torneio de tamanha envergadura e em nível mundial, foi formada uma comissão multidisciplinar com pessoas do IBAMA, zoos e diversos órgãos que lidam e cuidam de animais pelo mundo. Eles seriam responsáveis pela alimentação, acomodação, cuidados médicos e outros itens indispensáveis ao bem- estar de todos.
Já na parte funcional do campeonato, incluindo arbitragem, foram convidados grandes nomes do xadrez nacional, escolhidos tão somente pelo conhecimento, ensino e prática do xadrez no Brasil e até no exterior, e nada além disso.
Um número de doze pessoas aceitou trabalhar espontaneamente, foram elas: Álvaro Aranha, Rafael Leitão, Luís Coelho, Vitor Carneiro, Cíntia Leão, Alice Pavão (de Santa Catarina), Marco Aurélio Cordeiro, Pedro Falcão (de Belo Horizonte), Adriano Barata, Felipe Lobo, Fabiano Bezerra e Erasmo Falcão.
A equipe interdisciplinar cuidou dos mínimos detalhes, estudando hábitos do cotidiano de cada animal, e, claro, a alimentação deles.
A comida foi preparada e supervisionada de acordo com os hábitos de cada animal, com bastante fartura. Compunha o cardápio: bolinhos e bifes de soja com aroma de carne, biscoitos, mel, capim à vontade.
Os animais inscritos, assinariam um termo, se comprometendo a abrir mão, durante os seis dias do torneio, de sua alimentação convencional, ou seja, de alguém de sua cadeia alimentar. Por óbvio, não poderia faltar comida! E, dessa forma, não haveria aquele insaciável instinto animal.
Resolvidos todos os pequenos e grandes detalhes, foi aberto o lindo espaço reservado para o torneio, exatamente um mês após o anúncio deste.
Até academia de ginástica foi montada no local, para aqueles que se interessassem em exercitar nas horas de folga.
Começaram a chegar os animais de diversos locais do mundo. Os que iriam competir, mais alguns treinadores e muitos visitantes, e, também, muitos curiosos para conhecer o jogo.
Desde o primeiro encontro, anterior ao do início do campeonato, uma grande confraternização se iniciou no mundo animal. Muitos se mostraram bastante curiosos em conhecer outros animais, e, estando bem alimentados, como precaução, foram se interagindo e perdendo o medo de um possível incidente entre predador e presa.
Vez por outra, animais se reuniam em pequenos grupos, trocando ideias e experiências de vida.
O que muito discutiam eram problemas relacionados ao nosso lindo planeta. Falavam da dificuldade em sobreviver diante de tamanha adversidade, como, por exemplo, desmatamento, aquecimento global, extinção de espécies, camada de ozônio e outros assuntos relacionados.
Foi muito interessante de se ver numa mesma roda de bate-papo: o leão, a zebra, o búfalo, a girafa, o tatu, etc., cada um demonstrando seu entusiasmo com o campeonato e a sua organização.
Na chegada dos animais, havia uma ficha a ser preenchida, na portaria do acampamento. A ficha pedia: peso, altura, espécie, país de origem e cor predominante. Apesar de ser mera formalidade, poderia ser útil para uma pesquisa futura.
Tivemos um atraso na entrada, por causa da zebra, que literalmente, agarrou na catraca no preenchimento da tal ficha. Ela ficou mais de quarenta minutos se questionando sobre sua cor.
Só depois que Cíntia Leão e Alice Pavão perceberam o problema, se apressaram para ajudar a contar as listras pretas e brancas e medir a largura delas. Devido à dificuldade de se medir as listras e pelo constrangimento a qual passava a zebra, resolveram marcar como iguais as listras pretas e brancas.
Álvaro Aranha interveio com o seu conhecimento, afirmando que: na barriga as cores brancas são mais largas, enquanto que nas costas, se destacam em largura, as cores pretas. Indagando, também, que quando as listras brancas predominam, é devido à ausência do pigmento melanina contido nos alimentos consumidos. Aranha ainda informou que nenhuma zebra tem a disposição das cores iguais a outra zebra, funcionando como uma espécie de impressão digital para elas.
Com os animais em número de sessenta e quatro, já acomodados nos aposentos, minuciosamente preparados para eles, descansaram até mais à tarde, quando foram chamados para o congresso técnico, onde foram explicados os detalhes de arbitragem, o funcionamento do torneio e a premiação.
Vale destacar que a premiação, do 1º lugar, seria uma participação no filme Madagascar 5 e uma possível entrada para o mundo do cinema; do 2º, uma viagem ao redor do mundo por trinta dias com tudo pago; do 3º, um mês de férias no melhor resort do Caribe (nas Ilhas Cayman), e do 4º, um cruzeiro de quinze dias pelo Caribe. Do quinto ao décimo, seriam entregues lindos troféus. Do 11º até o 20º lugar, belas medalhas. E, além do mais, os patrocinadores distribuiriam para os sessenta e quatro animais, bolsas contendo interessantes brindes.
Logo depois do congresso técnico, todos participaram de uma grande festa com bastante comida e brincadeiras.
E, mais tarde, foram dormir e descansar em seus aposentos.
De manhã bem cedo, todos acordados, dirigiram-se ao refeitório, onde tomaram o café da manhã, cada um ao seu modo.
E saindo o 1º emparceiramento e início às dez horas, vamos nos ater a comentar alguns encontros curiosos e destacar as primeiras mesas.
Ao leão foi dado o privilégio de jogar a primeira rodada na mesa um, mesmo porque não havia ainda rating.
A girafa, na mesa dois, cedeu o ponto para o macaco, e aconteceu, principalmente, por dois motivos: a girafa fazia o lance e saía a pescoçar as mesas mais próximas; o outro motivo foi, que o macaco quando fazia o lance, mesmo que sem querer, coçava a cabeça, dando a impressão de dúvida ou incerteza, o que levava a girafa a ficar procurando lances, perdendo preciosos minutos e a partida.
Essa estratégia do macaco iria render mais alguns pontos nas futuras partidas.
Na mesa oito, o jogo entre a preguiça e a tartaruga terminou na queda da seta de tartaruga, depois de cinco lances de cada competidor.
O jacaré, na mesa onze, fez sua terceira reclamação à arbitragem, alegando que o polvo, seu adversário, fazia o lance com um braço e acionava o relógio com outro, portanto, saindo aqui como vencedor com um xeque mate.
Na mesa doze, a cobra sofreu um revés, mesmo depois de uma bela enrolada no seu adversário: o quati.
O siri venceu o cachorro na mesa dezoito e comemorou com uma dança esquisita, porém, engraçada.
A anta, na mesa trinta e dois, foi derrotada, e logo pela capivara, que conseguiu seu primeiro e único ponto no campeonato, fazendo jus à fama.
A formiga na mesa vinte e cinco, perdeu no tempo sua partida contra o tamanduá. A dificuldade que tinha de empurrar as peças até o local desejado, foi o fator determinante para a derrota no tempo. E logo ela que esperava começar bem, pois trouxe uma grande torcida: família e amigos, todos atraídos pelo jogo e, principalmente, pela comida 0800 e à vontade.
O tamanduá num estilo Supi de jogar, fazia seu lance e se levantava para olhar as outras mesas, deixando lá a formiga com o problemão de mover as peças para o local desejado. Sendo o tamanduá muito esperto, ficava só olhando de longe.
Ainda bem que esse, bem alimentado que estava pela organização, não viu a formiga com outros olhos, senão numa só sugada, iria a formiga enxadrista, assim como sua torcida, pais, primos, tias e irmãos.
O tatu ganhou sua partida na mesa vinte e três e, por isso, está se achando.
Na mesa vinte e sete, a hiena, por várias vezes, fazia o seu lance e soltava uma risada, parecendo zombar do seu adversário, sendo, portanto, advertida com ameaça de perder pontos.
O hipopótamo e o rinoceronte na mesa trinta tiveram que jogar em pé, pois não havia cadeiras resistentes para eles, e, terminando no empate e com prejuízo de doze relógios literalmente amassados, quando foram para o apuro de tempo.
Na mesa dezessete, o leopardo fez seu lance no jogo contra a lagarta e se levantou para comer algo na cozinha. Quando voltou, uns quinze minutos depois, encontrou uma borboleta sentada no lugar da lagarta, sua adversária. Ele parou o relógio e chamou o árbitro, que o explicou que aquilo era correto, mas foi difícil convencer o bicho que a borboleta era a lagarta de antes. Ele com muito custo aceitou e conseguiu vencer a partida.
O leão perdeu o seu jogo para o golfinho das águas da Noruega e, na segunda rodada caiu para a mesa vinte e dois, avistando de longe a mesa um, no alto do tablado, com muita tristeza.
Teve que aceitar, pois é regra, e entender que no xadrez não prevalece o mais bravo, o mais bonito, o mais novo ou qualquer outro atributo, mas sim, o bom jogo e jogador, fruto de muito estudo e dedicação.
Como poderíamos imaginar um leopardo, na segunda rodada, sentado jogando contra o antílope, sem importuná-lo. Só mesmo estando bem alimentado!
A canguru fêmea, a enxadrista nº1 da Austrália, na segunda rodada, contra a pata na mesa quatorze, seguia com sua mania de lançar as peças capturadas da adversária, na bolsa que toda fêmea canguru tem, para carregar os seus filhotes. Aqui, no entanto, ocorreu algo inusitado, a pata chegando com o seu peão na oitava, precisando da dama branca, que estava dentro da bolsa da canguru, requisitou a peça à adversária. E a canguru se pôs a tirar as peças de dentro da bolsa. E tinha tanta coisa lá, como por exemplo: batom, óculos de sol, esmalte, cortador de unha, lixas, superbond, etc, etc, etc.
E assim só depois de oito minutos mais ou menos, é que se achou a tal dama branca para a coroação. No entanto, logo depois a canguru coroou seu peão e acordaram em empate.
Alguns animais nessa segunda rodada, prevaleceram com seu bom jogo e subiram na tabela, como o urubu, o porco, o galo, o gavião, a raposa e claro, o golfinho, que liderava no critério desempate.
Terminada a rodada de número dois, alguns animais se recolheram aos seus aposentos, enquanto que outros preferiram continuar no salão de jogos, em resenhas, em análises e mesmo se divertindo e se alimentando.
No outro dia bem cedo, de novo o café e logo depois às nove horas, a terceira rodada.
Na mesa seis, o galo foi surpreendido pelo bom jogo do flamingo e sofreu seu primeiro revés. O flamingo, além da vitória, somando três pontos, era considerado um dos mais bonitos competidores e de maior torcida do torneio.
Suas lindas cores rosa-laranjadas, são assim definidas, devido à sua alimentação à base de algas e camarões, ricos em carotenos (pigmentos orgânicos), que processados quimicamente em seu organismo ajudam a gerar as lindas cores predominantes.
Na quarta rodada à tarde, o vagalume perdeu outra e continuava em último, segurando a lanterna, sem ponto algum.
O elefante venceu seu jogo e soma três em quatro. Mas o incrível é o seu saber nas diversas aberturas, mostrando uma memória incrível.
Tivemos aqui nessa quarta rodada uma surpresa e tanto, com a derrota do golfinho para o sapo. O golfinho ficou bastante admirado com a vitória do sapo, deixando no ar, uma possível fraude no jogo do seu adversário. Mas, ele resolveu se calar para não se comprometer, mencionando somente uma única frase ou provérbio.
“Os cães ladram e a caravana passa”, e disse que explicaria isso numa outra ocasião.
Por outro lado, o sapo quando questionado por um repórter, à respeito das dúvidas quanto à sua vitória, soltou também um provérbio “À noite, todos os gatos são pardos”, e se retirou para seus aposentos, sem dizer mais nada.
No outro dia, pela manhã, perguntado com insistência, somente disse que estava limpo e se preciso fosse, ele jogaria até pelado.
Na verdade, a imprensa mundial que não dispensa muito tempo e espaço para o xadrez, adora uma treta, resolveu investir mais tempo nessa polêmica, logo que soube dela.
Se por um lado foi ruim para o xadrez, por outro lado, indiretamente, estão cobrindo o campeonato, falando dele, dos presentes que estão disputando e dos convidados em geral, ou seja, dando a atenção que esse esporte merece.
No dia seguinte, nos confrontos da quinta rodada, tivemos jogos interessantes, como: o dragão do Kômodo, uma região da Oceania, venceu seu jogo na mesa sete, chegando a quatro pontos em cinco disputados. O bom desempenho dele se deve muito em função do estudo e aplicação na Abertura de nome: Defesa Siciliana, variante do Dragão Acelerado. Ele a executou em algumas partidas, com maestria, o que lhe rendeu alguns pontos.
Na mesa nove, tivemos o confronto entre o camaleão e o leão.
O camaleão possui uma camada de células epiteliais que contêm nano cristais de guanina flutuantes, e a aproximação ou afastamento desses cristais, geram a reflexão de luz em comprimento de ondas diferentes. Em estado de relaxamento e passividade, o camaleão se apresenta com as cores refletidas em tom bastante fortes, em azul e verde, lindíssimas. Porém, quando estressados ou em perigo, ele se apresenta com a cor amarelo-laranja-avermelhada. E exatamente por isso, já tenso, por ser o leão, o seu adversário, ele sentado na mesa de número dezenove, mudou seu tom de cor.
Depois de um certo tempo, o leão fez o seu lance de nº 14, se levantou, para relaxar um pouco, se alimentar e beber algo.
Mas quando retornou à sua mesa, vinte minutos depois, encontrou um lagarto de cor azul e verde, parou o relógio e foi buscar um árbitro, e quando voltou com o árbitro, o lagarto era de novo, amarelo-laranja-avermelhada e aí ficou muito nervoso, achando que estavam trolando com ele, o “Rei dos animais”.
Foi preciso umas oito pessoas para segurarem o bicho, e, depois, já mais calmo, lhe explicaram a situação. Ele entendeu, depois de muito esforço da equipe de arbitragem. Assim, o jogo prosseguiu, com o camaleão jogando o resto do jogo nas cores amarelo-laranja-avermelhada. E o leão de olho nele e claro, com oito árbitros bem junto à mesa, até o desfecho da partida que culminou com a vitória do leão.
Cumprimentaram-se e até se tornaram grandes amigos, depois que Pedro Falcão, com sua grande sabedoria, explicou que o nome camaleão origina-se do grego e quer dizer: “Leão do Chão” ou “Leão da Terra”. E depois de tudo isso, leão e camaleão são vistos sempre juntos, com o camaleão sempre exibindo as suas cores azul e verde, refletindo seu tom natural em momentos de tranquilidade.
Nessa mesma rodada, em um momento dos jogos, alguém gritou na plateia: Arca de Noé, Arca de Noé, e aí alguns assistentes rapidamente perfilaram de dois a dois, esperando o chamado, e era verdade sobre a Arca de Noé, na mesa doze, pois esse é o nome do golpe tático, em que as negras, tendo o bispo sido aprisionado, o perdem na simples troca por um peão. Mas, o mais engraçado e que ajudou a gerar tamanha confusão no engano do nome é que estava bastante nublado e ameaçando cair uma grande tempestade, o que na verdade não aconteceu. E assim com a perda do bispo, o leão perdeu seu jogo para a zebra e deu a lógica aqui.
Já na parte da tarde, pela sexta rodada, o galo foi surpreendido pelo bom jogo do porco, e perdeu mais uma. Essa derrota o afastou do título.
Definitivamente, 2022 não tem sido um bom ano para o Galo, que vem fazendo partidas bem abaixo de sua capacidade, e, tendo trocado de treinador por três vezes, não tem encontrado seu melhor “xadrez”. Quem sabe se com a inauguração do galinheiro novo, daqui a uns poucos meses, ele com mais tranquilidade para treinar, volte ao bom jogo de 2021. Um comentário curioso do Galo, foi que se ele ficasse em 4º lugar, dispensaria essa premiação, pois não aguentaria um Cruzeiro por quinze dias.
A raposa na mesa sete ganhou mais uma, provando ser esse um ano brilhante e de melhor desempenho entre os animais brasileiros. Um ano fenomenal esse para a raposa. Depois dessa rodada, alguns a chamaram para malhar na academia e ela curta e grossa, disse que não iria pois não queria ficar com um corpo “Atlético”.
Terminada essa sexta rodada, alguns animais depois de se alimentarem, foram dormir, enquanto outros se reuniram em grupos.
Bem num canto da imensa área de lazer, havia um pequeno grupo de perdedores da rodada. Estavam lá resenhando: o rato, a arara, o galo, o sapo e o lobo, esse vindo de mais um empate.
Eis que passou rasante o papagaio repetindo por duas vezes: “A torre da derrota”, “A torre da derrota”.
E assim o galo deu um salto e conseguiu agarrar o papagaio pelo pescoço e disse:
_ Cê tá me tirando?
_ Está me trolando porque viu que perdi por causa da minha torre capturada de graça?”
Mas antes de começar o espancamento, o papagaio pensou rápido e soltou essa que lhe salvou a vida:
_ Não, seu galo, isso é um palíndromo, isto é, uma frase ou palavra que pode ser lida normal, igualzinha se lida de trás pra frente. Leia a frase: A TORRE DA DERROTA.
O galo afrouxou o pescoço do papagaio e cedeu na conversa do malandro e disse: é, tem sentido.
_ Prove mais que não está me trolando, crie mais uma frase.
_ E o papagaio fez mais uma.
_ Arara rara.
O lobo Guará pediu uma também.
_ O lobo ama o bolo.
_ Mais uma pra mim, disse o galo.
_ Olá galo.
_ O galo ama o lago.
E para o sapo: és sapo passe.
_ E aí, tudo em paz novamente, quando o rato pede a dele.
_ E o papagaio disse: melhor não.
_ O rato insistiu e saiu essa: Oi, rato otário.
O rato deu um salto no pescoço do papagaio, mas errou, e esse voou para dentro da mata, se livrando do primeiro incidente com vida, durante o torneio.
Em outro canto do salão, alguns animais exibiam suas cores, outros mostrando suas habilidades, como a foca no malabarismo com a bola, e o cisne dançando uma música clássica. O leitão, no centro de uma roda com dezenas de bichos, estava a contar as peripécias do personagem Napoleão, o porco ditador de: “A Revolução dos Bichos” de George Orwell. Já a canguru, estava a jogar australiana, com alguns da arbitragem.
Caiu a noite, e todos foram descansar e se preparar para o último dia do campeonato.
No outro dia, bem cedinho, todos de pé, e assim tomaram seus cafés, e logo se encaminharam para as mesas de jogos nesta sétima e última rodada.
O lobo Guará que também usa o Nick “Lobo Guiri”, nos jogos on line, empatou de novo, somando 3,5 pontos em sete.
O golfinho da Noruega, na mesa um, ganhou mais uma, confirmando sua fama de ser um dos três maiores de todos os tempos no xadrez entre os animais, mas claro que sabiamente jogou com o regulamento debaixo do braço, ou melhor, debaixo da nadadeira. Espera agora só o resultado final para se consagrar campeão.
O porco perdeu seu jogo contra o urubu, que jogou um xadrez fino, e ele juntamente com o gavião não paravam de trolar o porco, que ficou sem o mundial, sem realizar o seu sonho.
O lado um pouco triste aconteceu na mesa dezesseis, e outra vez envolvendo o papagaio, arranjador de encrencas. É que desde o primeiro dia, o papagaio que não jogou o torneio, vivia dando pitacos nas resenhas ou análise dos jogos terminados dos animais. E seus comentários eram frequentes e muitas vezes passavam dos limites. Vira e mexe, chamava alguém de anta ou de burro, após um lance errado.
Os outros animais não entendiam o significado daqueles termos e até diziam: “não sou a anta não, ela está na mesa nove”, muito ingenuamente. Mas aconteceu que o cachorro havia entregado o papagaio, explicando à onça e aos demais, o verdadeiro significado de tais termos. E aconteceu que a onça com 4,5 pontos ainda sonhava com uma medalha e no seu jogo contra a abelha, demorou a rocar e movendo peça errada, levou mate, o beijo fatal ou beijo da rainha, aplicado pela abelha inteligentemente.
Aí o papagaio não se conteve e soltou essa:
_ Você tinha que ter liberado o bispo e ter feito o roque logo, sua anta.
A onça então, muito nervosa, pela perda da partida e da medalha, soltou uma patada na ave falante, arremessando-a contra uma árvore.
O papagaio levantou-se rapidamente, pois a onça vinha na sua direção para terminar o serviço: cancelar o CPF dele, literalmente. E bem amarrotado, tentou voar só com uma asa, o que conseguiu, pelo desespero, e entrou para dentro da mata, com a onça em seu encalço.
Conseguiu, finalmente, escapar e foi embora pra casa, mas sem antes passar num posto médico, para imobilizar uma das asas, bastante danificada, muitos curativos por todo o corpo e tomar uma antitetânica. E enquanto voltava pra casa, numa ambulância do SAMU, refletia sobre todos os acontecimentos desses seis dias e pensava em não assistir torneios de xadrez tão cedo.
O gambá que também usa o nick para jogar on line “Fedoseev GM 33”, por ser fã do russo, ganhou sua quarta partida, ficando bem colocado, em 13º lugar, arrebatando uma linda medalha.
O elefante também se deu bem nesta última rodada contra a égua, chegando a cinco pontos e ganhando um belíssimo troféu.
A égua cumpriu bem sua jornada, mesmo perdendo essa, somou 4,5, ficando em nono lugar e recebendo também um bonito troféu. O curioso no seu jogo, era sempre a opção pelo par de bispos, abrindo mão de seus cavalos, e até os sacrificando, quando preciso.
O cachorro usou nessa última rodada contra a hiena, a defesa hipopótamo, depois de analisar partidas do G.M. Gata Kamsky e se deu bem, medalhando também.
Já o rinoceronte tem jogado o gambito elefante, de pretas e aqui contra o leopardo, obteve compensação com o sacrifício de um peão e venceu bem seu oponente.
O macaco jogando de brancas o lance b4, da abertura, orangotango, saiu-se bem contra a girafa e também medalhou, com quatro pontos.
O leão com a vitória sobre o javali, chegou também a quatro pontos e está de novo achando que é o Tal.
A zebra ganhando da pata na mesa dezenove, voltou a se emPolgar, ganhando medalha também, com quatro pontos e aqui deu a lógica de novo.
Terminada a última rodada, a classificação final ficou assim, até o 10º lugar:
1º Golfinho, da Noruega = 6 pontos
2º Raposa, de Minas Gerais = 6 pontos
3º Urubu (Fluminense) = 5,5 pontos
4º Gavião = 5,5 pontos
5º Porco (sem mundial) = 5 pontos
6º Galo = 5 pontos
7º Elefante = 5 pontos
8º A Canguru = 4,5 pontos
9º Égua = 4,5 pontos
10º Flamingo = 4,5 pontos
Após a divulgação do resultado final, aconteceu a premiação, com muita festa, entrevistas, fotos e uma linda confraternização final.
O golfinho, campeão mundial, em sua entrevista bastante disputada, revelou que não vai colocar seu título em jogo, abrindo mão dele, por estar cansado de tanto estudo e entrega, e que de agora em diante, vai jogar só por prazer.
Isso causou enorme surpresa no meio do xadrez mundial animal.
O vagalume prometeu se empenhar mais nos estudos e quem sabe brilhar mais nos próximos torneios.
O ganso (fluminense) dava inúmeras entrevistas, demonstrando também aqui ser bastante elegante, como em seus jogos.
Uma situação por detrás das cortinas e que quase acaba em confusão, aconteceu por causa de um encontro repentino entre o sapo e o golfinho.
O sapo ameaçou o golfinho com um possível processo na Justiça, por este levantar suspeitas quanto ao seu jogo.
_ O golfinho então disse:
_Você chegou agorinha e já está querendo se sentar na janela? Eu sei o que você fez no verão passado...
E o sapo retrucou:
_ E você que está sempre se achando como o último biscoito do pacote.
Os dois, bastante alterados, só não se atracaram por causa da intervenção dos seguranças, mas foi por muito pouco.
E os repórteres logo que souberam disso, correram até o sapo, para ver se tiravam alguma informação dele, diante da polêmica de possível uso de equipamentos de fraude. Mas ele não respondeu nada, exceto quando alguém perguntou:
_ E por que então que você usa o nick on line, Hans?
E ele tirando onda só respondeu:
_ É porque sou muito namorador e comigo é no plural mesmo, pronto, está dito.
O porco apesar do lindo troféu, conquistado de 5º colocado, andava de um lado para outro, e bastante chateado pela zoação do gavião e do urubu, que a todo instante o lembrava que ele não tinha o mundial. Toda hora os dois o chamavam: Ei meu bom, não deu, né?
O lobo Guiri também tirava onda, por ter sido o único sem derrota, porém, com sete empates.
Já o elefante, aproveitou a deixa numa entrevista para fazer seu desabafo.
Expos toda sua indignação pelo uso por outros, do nick: “Elefante 38”, o que segundo ele, que foi quem o criou, no ano passado, quando tinha trinta e oito anos e hoje, trinta e nove. E que alguém se apropriou dele, sem permissão. Deixou claro que não tem nada contra Felipe El Debs, mas quer o número dos celulares do Axel Backman e do Néuris Delgado, de todo jeito.
Chegou a última noite, depois de toda essa imensa festa do xadrez mundial entre os animais, todos se dirigiram aos seus aposentos para arrumarem suas malas e retornarem para suas casas, seu habitat. Havia uma certa tristeza, como em todo final de festa, mas ficou aqui uma certeza: de que o xadrez no mundo animal nunca mais será o mesmo daqui pra frente e que nos próximos encontros, promete muito mais.
Então é isso, final de festa e muitas estórias pra contar.