A CRUEL MATEMÁTICA DA VIDA

Completei 75 anos. Não sei quantos ainda viverei. E nem quero saber.

Dizem que tive mais um ano de vida, na verdade, tenho um a menos. Não ganhei um ano, gastei um. Meu estoque de tempo está encolhendo.

Cada vez que olho para meu arquivo de dias disponíveis, falta um. Parece que alguém andou mexendo ali. Ui! Chega dar arrepio.

Então vamos para a matemática. Se partir para frações, sei que não tenho mais a metade de vivência do que já vivi, nem 1/4. Talvez tenha 1/8, graças à bondade divina. Montei uma equação de primeiro grau para calcular o tempo de que disponho, mas equação de primeiro grau com duas incógnitas torna-se incalculável.

Deixa isso para lá. Esse tipo de conta é complicado e deprimente.

Apenas sei:

que estou vivo; que sou grato pela tua amizade;

que estou bem de saúde;

que sou feliz.

Aprendi que o andar da vida

não deve marchar ao compasso do tic-tac de um relógio, mas na ciranda da felicidade;

não pode estar atrelado a metas de conquistas, mas à alegria de viver;

não é para ser medido por fita métrica, mas por emoções;

não deve estar cercado de pesadelos, mas de sonhos;

não é para ser digerido, mas degustado;

não é para passar, mas para ser curtido;

não foi feito para carregar o peso da angústia, mas a leveza dos bons fluídos.

A forma de agir, de ver, de se conectar e de sentir que tempera o nosso cotidiano.

Os últimos 10 anos passaram como um vendaval. Os próximos passarão como um tufão... Questão de minutos.

Em vez de me estressar, irei aproveitar cada momento que me resta; desfrutar a liberdade; conviver com a família; beber e fofocar com os amigos; brincar com meu netinho; levar flores para ela; andar de bermuda e chinelo; dizer mais “sim” do que “não”.

Assumirei o papel de um vozão folgado e bonachão.

Claro que não serei daqueles velhos fedidos que não tomam banho, que coçam o saco em reunião social, que peidam e arrotam na frente dos outros ...

Quero ser um velhinho charmosinho.

Ah! E tem mais. Vou meter o olho na bunda das gostosas. Com certeza, vou. É sinal que ainda enxergo. Aliás, minha mulher já me autorizou a fazer isso. Ela só não quer que eu passe a mão. Mas expliquei a ela que, enquanto não fizer a cirurgia de catarata, usarei o método “braile”, ou seja, só vejo se apalpar.

Também seguirei as premissas dos famosos e chulos provérbios ditos pelos jovens:

“Cagan... e andando” , “Fod...-se o mundo”, “Que todo mundo vá pra pqp”, “Não tô nem aí.”.

Se soubesse quando seria a data derradeira da minha existência, aumentaria as doses de uísque para que no meu velório alguém declarasse: “Tornou-se um alcoólatra, mas não incomodou ninguém ... Na hora que virou bêbado, morreu.”

Ou que lindo se me tornasse um perdulário e ouvisse a seguinte declaração:

“De pão-duro, passou a esbanjador. Zerou a conta. Não deixou um centavo, mas não ficou devendo nada e nada tem a receber.”

Maravilhooooso!!! Que morte sensacional!!!

Enfim, baseado na experiência de um vivente de 75 anos, decidi estabelecer duas regras que nortearão a minha vida daqui para frente:

Regra número 1: Não obedecer nenhuma regra.

Regra número 2: Devido à regra número um, esta e as demais estão prejudicadas.

Ah! Como o esquecimento já faz parte da minha idade, desculpem se não me lembrei de agradecer os Parabéns recebidos. Obrigado pelo carinho de vocês, meus queridos amigos.

FIM